ORDENS
SUPERIORES?
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Bruno
Pessa
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Sempre que entra em São Paulo, o ônibus de Ribeirão Preto pára rapidamente na base policial do Piqueri, antes de seguir para o Terminal Rodoviário do Tietê. Mas nesta noite de domingo ele foi obrigado a passar reto. Para espanto geral, o acesso à base estava impedido. Postados na calçada, os policiais, espingardas nas mãos, eram obrigados a manter vigilância irrestrita. Ordens superiores? Pela dimensão do medo que o Primeiro Comando da Capital (PCC) propagou aos paulistas em coisa de 24 horas, não seria descabido questionar quem primeiro comanda a capital de fato. Que estamos a milhares de quilômetros de nos sentirmos seguros em nossas cidades, evitando por isso certos locais em certos horários, ninguém mais discute. Mas o clima daquela segunda-feira lembrou um pouco o que a gente via, até então só de longe, naqueles malfadados países árabes: armas nas ruas, ônibus em chamas, prédios evacuados, multidões buscando refúgio em casa. No decorrer do dia, reagir com naturalidade foi ficando impossível. De manhã, a turma discutia como o crime pode ser tão organizado, graças à corrupção de quem colabora com ele direta, nos presídios, e indiretamente, nos gabinetes da segurança e da política. Depois voltamos para a aula, como que enterrando o assunto. Mas era preciso almoçar em algum lugar, e não havia quem desgrudasse da TV, até porque o jornalismo da Globo não saía dela. Éramos quatro jornalistas na mesa, mas mesmo assim não havia assunto, diante das bocas paralisadas por números e imagens assombrosas. Nem parecia que o Brasil tinha os 23 da Copa definidos minutos atrás. A sessão da tarde numa cinemateca com filmes de Truffaut seria a fuga perfeita. Porém, a Globo insistia com o SPTV como vale a pena ver de novo. Quando a mulher da cantina falou em ataques a estações do metrô, comecei a pensar que o pânico já gerava boatos - e não estava de todo errado. Fomos para a sessão, mas nem ali conseguimos escapar: num dos celulares, a notícia do cancelamento das atividades de terça na pós, em ressonância ao que comércio, indústria e educação haviam decidido em todo o Estado. Na mais do que nunca esperada volta pra casa, meu celular dá os recados preocupados de mamãe e do papai, mas não consigo retornar, pois as redes estão tão congestionadas quanto as avenidas paulistanas depois das seis. Tomara que os eficientes celulares do PCC sejam iguais aos meus... Tive de abdicar da sopinha noturna, já que os supermercados não ousaram não se esconder. Relutei o mais que pude, tentando desencanar, mas a ansiedade por informações foi direto para a TV. Pelo telefone, veio a notícia de que o interior compartilhava do medo da metrópole. Que merda, tudo parando e resistindo ao medo, unicamente ele, a tensão por não saber quem pode ser a próxima vítima. Se atravessar a rua fica arriscado, o que nos resta? Trancar-se atrás de um portão até os meninos maus do PCC não quererem mais brincar? É, eles estão prendendo a sociedade. Por quê? Ordens superiores. A certeza é uma só: quem pode, manda. Quem não pode, abaixa as portas. |