TÃO FRÁGIL RESPIRAR
Bárbara Helena
 
 

O vento arrepiava folhas, levantando poeira fina.

Seu respirar

Fechei janelas e aumentei o fogo da lareira. Ultimamente, frio me desagradava. De todas as coisas tristes,a pior. Desgostar do frio. Livros de magias dispostos nas paredes me entediam. Mulheres que guardei no fino cristal me aborrecem. Sangue me dá náuseas, gente me, tão cansativa. Tudo sempre igual, mesmo desejo de transgredir, mesma rebeldia idiota.

A areia era clara, estrelas brilhavam... sim, brilhavam. Minhas mãos geladas ,seu sorriso.

Pai me olha da poltrona, nem parece morto. Mas só pode renascer nos dias ímpares. Odeio estes dias. Ele e minha mãe pensam que me divirto em donzelas assassinadas. Tédio. Odeio seus gritos de pavor. Não tem nada mais chato do que o medo das vítimas. Não existe graça em apenas matar, não há tesão em rasgar pescoços claros com dentes pontiagudos. O que me excita é muito mais sutil.

Sentia frio e seus ombros tão doces. Posso carregar os livros? Você disse que sim, evitei sorrir.

Meu sonho era usar aparelho nos dentes, ir para a universidade, aprender mecânica. Andar de bicicleta... quando disse isto, meu pai quase morreu no dia errado. Onde já se viu um vampiro atleta? Queria tomar sol e, suprema heresia, usar bronzeador.

Suas pernas morenas, olhos de maresia, seus dentes iguais. A voz ligeiramente nervosa, você tinha medo de mim, não sei porque.

Mãe escondeu do pai, eu torcia pelo mocinho nos cinemas. Bandidos são muito previsíveis. Preferia morrer de verdade, com velas e panos roxos, gente chorando em volta, lindo isto. A vida me encanta, a vida que se esvai assim, bem delicada.

Mas tenho que dormir num maldito caixão e nunca morrer, mas levantar todos os dias desgraçados para viver a mesma entediante maldição.

Sua respiração alterada me excitava, não pelo medo, não, o inusitado. Ninguém tem emoção na nossa casa. Você ria, agitada e levantava as mãos entre as estrelas. Achei você tão linda, desejei chorar.

Estudei anos, procurei feitiços, os mais poderosos, tentando me livrar. Mas não consigo reverter o destino.

Através do vidro vejo a lua pálida. Uma jovem caminha distraída.

Então eu te matei bem devagar. Porque é tão leve a vida, tão maluca. Tão frágil respirar sumindo em minhas mãos, pássaro úmido.

Pela primeira vez em muitas semanas senti de novo a excitação da caça.

Posso te acompanhar?

Você sorri. Tão frágil respirar, pássaro úmido.

 
 
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