SÚPLICA
Luciana Pareja Norbiato
 
 

Enquanto ela atravessava o amplo salão de festa com a saia curta e vermelha, os cabelos clareados artificialmente e um ar de despreocupação beirando o vulgar _"todo esse frescor, Meu Deus"_, João tentava conservar os olhos e a atenção no interlocutor sentado à sua frente. Erudito. Rico, muito rico. E famoso, fosse por sua fortuna, fosse por sua elegância, por seu status diante do mundo dos jovens homens cultos e viajados. Rico de berço, sem a necessidade outra que não manter uma fortuna que não se esforçara para ganhar. Quem era ela para tirá-lo do sério daquela maneira? Uma moça "classe média", sem roupas caras, sem livros raros debaixo do braço, sem classe, sem educação.

Quem era ela? Aquela energia espontânea que arrebata onde quer que esteja.

Deu de encontrá-la com freqüência desde que a conhecera na praia, acidentalmente: enquanto andava de bicicleta pela ciclovia, seu amigo perdeu a direção e esbarrou nela. Alguma escoriação na perna direita, por sorte não estava indo rápido, e o amigo fez questão de levá-la ao hospital. E para jantar. E a teria levado para a cama, se não fosse a total indiferença da garota. Despreocupada que só. Sem qualquer traço de pretensão, no entanto. Parecia simplesmente não se dar conta de que havia esse interesse em jogo. Ou isso não abalava em nada seus próprios interesses, alheios a qualquer forma de jogo. Ela achara o convite gentil, quisera jantar, e só.

João observava a cena como coadjuvante, tímido que era, mais tímido por sentir uma atração inexplicável por aquela garota estranha, ali, sentada ao seu lado. O amigo fez sinal para que ele sumisse, mas não podia, não sentia vontade de deixá-la à mercê do outro. Despediram-se os três à porta do restaurante, ela quis pegar o circular, recusou a carona oferecida pelo outro. Foi-se. Respirou aliviado, o João.

Mas daí em diante, bastava sair de casa, dava de cara com ela, passando pela calçada, saindo de um banheiro público, falando no orelhão, tomando sol em um biquíni de listras que o deixava mortificado.

Ele a queria para si. A súplica nos olhos. A dor no peito. Ele a queria para si.

Não havia o que pudesse ser feito, no entanto. Pasmado, não conseguia dirigir-lhe a palavra, não conseguia pedir nada que fosse. O quanto ele gostaria de pedir... Se fosse capaz de pedir.

 
 
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