O QUE NÃO QUERO
Francine Ramos
 
 

Na noite é que os pássaros silenciam a dor da despedida, desistindo de cantar e da comida mesmo caída próxima. Eu sou assim: a medir passos tortos entre um olhar e outro, mas todos os que não quero. É medo de tocar o real desejo, medo de sentir alegria demais e depois não suportar a saída.

Lembro com meu coração, corpo e mente quando ele tocou suavemente meus cabelos, minhas pálpebras úmidas e sentiu o meu suor. Era noite de inverno, nossas roupas pareciam poucas ao nosso desejo de não tê-las. Muito frio e um medo correndo em mim, mas que me jogava a sua frente.

Eu me perdi no seu olhar, na vasta profundidade que sua vida me dizia, nos objetos a nossa volta, tão pequenos perto de nossas sombras grudadas. Finitas na linha do tempo ao toque da lâmpada. Visão vã das coisas, das janelas e paredes que poderiam nos esmagar, que continuaremos felizes presos em nossos sonhos.

E se de repente eu sentisse seu corpo distante? E se de repente eu sentisse seu olhar em outra direção? Não sentiria medo, esperaria angustiadamente, pela volta do seu olhar para mim. Será que isto aconteceria? Será que eu me perderia na busca errônea por olhos iguais? Parecidos que sejam na sua doce aventurança de olhar a vida com olhos de menino, mesmo na última vez, mesmo como um último pedido.

 
 

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