ALLEGRO MISANTROPO XIV
Sérgio Galli
 

(Ao som de Palhaço, de Egberto Gismonti)

Mais uma vez, como sempre, o ódio venceu. A sentença é sobre o referendo, CPIs e tantos outros fatos. Venceu a cultura da violência. Venceu a canalhice. Venceu o cinismo. Venceu o baixo clero. Venceu o caixa dois. Venceu o mal menor.

Venceu o "jeitinho brasileiro". Venceu a mediocridade. Venceu a vulgaridade. Venceu o nivelar por baixo. Venceu a "baixaria".

Venceram, para variar, as grandes corporações, os senhores do universo. Venceu o vil metal. Venceu a banalização do mal.

Venceu o narcisismo. Venceu a egolatria. Venceu a ignorância. Venceu a estupidez. Venceu a barbárie civilizatória em um mundo de corações e mentes endurecidos, embrutecidos.

Ostrogodos, visigodos, mongóis, vikings, normandos, germanos, celtas, hunos, são anjos de candura comparado aos novos bárbaros. O predador mais sanguinolento, um leopardo, por exemplo, não passa de um gatinho de estimação comparado ao verdadeiro predador, o homo dito sapiens. Uma dessas aves carniceiras, um urubu, por exemplo, não passa de um doce pássaro canoro comparado ao maior carniceiro, o homo dito sapiens. Só o humano é desumano. Uma ave de rapina não é desumana. Um lobo não é desumano. Uma serpente não é desumana. O dragão-de-komodo não é desumano.

Venceu a força bruta. Venceu a truculência. Venceu a arrogância. Venceu os fascismo ("o germe que o engendrou ainda está vivo", nas palavras de Bertold Brecht).Venceu o bang-bang. Venceu o marketing. Venceu a sociedade do espetáculo.Venceu a desrazão. Corações e mentes seguem endurecidos, embrutecidos.

Sugestão de leitura: "Uma breve história do homem", Michael Cook, Jorge Zahar Editora, 2005.

 
 

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