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Josete Maria Vichineski
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O ônibus, uma lombriga gigantesca e sanfonada, é uma trilha sonora de celulares. Não ser encontrado é impossível. A tecnologia é aliada dos tagarelas de plantão. Vozes e risos estridentes ecoam, vindos de crianças e adolescentes, carregando mochilas cheias de livros coloridos, como os seus sonhos. Uma parada em frente à rodoviária. Malas e mais malas vão entrando: ___ Vai para o centro? ___ Quanto é a passagem? ___ Pára, motorista. Vou descer, peguei ônibus errado! Já estou atrasada e estas malas sem alça me fazem perder mais tempo ainda. Parece que elas não têm hora para nada. Esta linha é enrolada mesmo. O ônibus prossegue. Pára num sinal. Os minutos parecem intermináveis: um, dois... dez, onze... Nossa! Já estou onze minutos atrasada?E a prova de Técnicas de Redação, sobre o tema "Talento e Sorte", será que poderei fazê-la? As fofoqueiras colocam as suas novidades em dia: ___ Fulana ficou com Ciclano. ___ Ele é um gato! ___Gato e galinhão. A esperança por um emprego nos acompanha nesta viagem, que parece interminável: ___ Fiz ficha numa empresa, ontem. Hoje fui chamado para entrevista. ___ Você consegue, cara, tem segundo grau e curso de computação. Os minutos vão se alongando, intermináveis. Parece que o deus do Tempo e a deusa da Linha Enrolada fizeram um pacto. O de desenrolar esta linha sem um tempo determinado para terminar. E a minha prova? Sorte não estou tendo nenhuma e o meu talento vai ser jogado fora, pois não poderei fazer a prova. Toca um celular de modo tão estridente, como se fosse o apito de uma linha de trem: ___ Alô! Estou no meu carro, É, cara, comprei um, zerinho, zerinho... Outra parada. Sobe, com dificuldade, uma senhora de cabelo branquinho. Um rapaz pergunta-lhe: ___ Quer sentar? ___Grata pela sua bondade, moço. Mas que bondade, nada. Os lugares reservados são um direito dos idosos. É nosso dever respeitá-los e deixar-lhes o lugar disponível. Um engarrafamento. Parece que houve um acidente com dois carros e um ciclista. O ônibus pára. Os minutos não cedem: vinte... trinta e cinco... Cada um arrisca um palpite: ___ O ciclista está ferido! ___ Há dois feridos! ___ O ciclista morreu! Depois de intermináveis minutos, chega a ambulância. O ciclista é levado. Está vivo. O trânsito, finalmente, é liberado. Parece um mar , com ondas compridas de veículos de todo o tipo. A pressa impera, neste horário. Por falar em horário, que horas são? Meu Deus, estou 42 minutos atrasada. Por que vim por esta linha? E a minha prova sobre o tema "Talento e Sorte"? O cobrador pergunta a um passageiro: ___ Não tem R$ 0,10? ___ Não, senhor. Só esta nota de R$ 2,00. Outro sinal. Mas que linha difícil de desenrolar! O deus do Tempo está contra mim e a deusa da Linha Enrolada está muito endeusada, para o meu gosto. Uma parada. Crianças descem, em algazarra, próximas a uma escola. Mais gente desce, outras pessoas sobem, servindo ao deus do Tempo, que adora atrasar o meu tempo. Agora já são 48 minutos de atraso. Quanto azar! E o meu talento para enrolar na prova vai por água abaixo. O ônibus segue sua viagem, vira a esquina. Entra no terminal central. Finalmente o deus do Tempo me dá um tempo e eu consigo me desenrolar da deusa da Linha Enrolada. Desço do ônibus, esta lombriga gigantesca e sanfonada. Nunca mais pego a linha 49. Só mesmo com muito sorte e talento para enrolar o professor de Técnicas de Redação eu conseguirei fazer a prova. |