IMAGINÁRIO II
Ana Terra
 

Deixei as brasas molhadas no berço do imaginário com a certeza de que o momento de alucinação havia sido levado pelo vento da madrugada fria.

Caminho pela tarde cinza. Chove. Minha pele está molhada mas não sinto calor nem frio.

Vejo meu corpo refletido nas vitrines coloridas. Sorrio. A imagem se multipla e me deparo com todas que já fui. Sinto curiosidade em saber quais ainda serei. Mas não me atrevo.

Em casa sou recebida pelo bigodes de Frida Khalo. Sinto fome. Devoro qualquer coisa mas o vazio continua. Meu espírito está faminto.

Retorno ao berço. Surpreendo-me ao ver algumas fagulhas. Sinto o frio das pedras nos meus pés descalços.

Um cachecol colorido se aproxima. Desta vez não há névoas e nem o fogo que me cegaram.

As mãos pequenas e macias tocam meu rosto. O calor do seu corpo agora é real.

Presa à minha boca está a língua de uma presença macia.

Não sei de onde você veio. Talvez das profundezas de um silêncio.

Nossos corpos e nossas águas alimentam a fogueira.

Não há nada a dizer. Prendo meus dedos em seus cabelos. Invado seus olhos. Sinto-me envolta pela delicadeza.

Nada mais quero. Corpo e alma serenados.

Agradeço ao talento de ainda acreditar e a sorte do imaginário tornar-se real.

 
 

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