PROVA DE NERVOS
Leo Mesquita
 
 

Os dedos batem na madeira, toc, toc, toc, toc. Barulhinho irritante que o cara do lado esquerdo insiste em fazer. Ou porque ele não sabe as respostas, ou porque ele sabe e não quer deixar ninguém acertar. Talvez seja porque terminou e não tem certeza das respostas e quer descontar em todos da sala. E lá na frente o supervisor observa com um olhar frio cada fileira. O assistente sentado na mesa olha para algo. Deve ser a lista de alunos onde ele procura nomes esquisitos e divertidos. A cor da sala é verde claro, as carteiras são marrons, o teto branco, e as cortinas são amareladas. É canhoto por isso o lápis começa a machucar o dedo de apoio. A mão fica suja e poderia ser um borrão de tão manchada. A batida dos dedos continua na mesa da frente. Duas batidinhas, pausa, mais duas, mais várias desconexas. E haja saco. As questões se misturam em salada de conhecimento.

Os dedos insolentes do cretino da frente continuam o samba da carteira doida. Se ao menos as batidas tivessem um ritmo.

Divida, some, toc, toc, multiplique e subtraia. Toc, toc.

Sem contar as orquestras paralelas. É só você começar a se concentrar e pode ouvir os lápis, canetas e borrachas. O papel reclama com seu gemido áspero. As batidas das pontas de grafite e os apontadores teimosos. Se você olhar no chão vai notar a chuva de borracha usada. As lascas de madeira. Os olhos do supervisor dançam por cima e entre as cabeças. Ele passa de seu lado e mesmo que você não olhe sabe que está te olhando. Quer ver se você encontra uma desculpa para te botar para fora. Encontrar uma cola descarada e ver suas mãos tremendo com ele passando ao lado. Melhor prender a respiração. Faça cara de concentração e pense no dia ensolarado que está por vir e você fora dali. Mas Tem a batida de pés a quatro carteiras daqui. E tem as mordidinhas na ponta oposta da caneta. As questões matemáticas são as que mais pedem nervos de aço. Eu tento imaginar a cara do professor que as criou. Um débil escondido no porão do sadismo. Um viciado em números que se masturba pensando em equações complexas. E dá-lhe pegadinha inútil. Põe resposta com diferenças mínimas para te ferrar o sossego. A- 101, B- 102. por uma diferença pequena você pode escorregar na banana e cair de cabeça na quina algébrica. A tampa dentro da boca é mastigada por todos os lados. Quando termina o serviço pensa se o melhor não é cuspir no cara do batuque dos dedos. Mas retira o chocolate do bolso. Nem vê direito e o açúcar já está no sangue. Aquele gosto tão doce que chega a amortecer a língua. A energia que passa por todo o corpo. Pronto! Terminou a prova e fica desenhando nas folhas de rascunho. Aqueles desenhos de pauzinhos de quem não sabe rabiscar. Na verdade tenta esquecer das questões que chutou, das que não sabia e das que vai odiar para sempre. Se o teste fosse para gritar de desespero certamente ganharia de longe. Melhor ainda se estivesse crucificado no quadro negro. Uma mão presa por uma caneta, outra por um lápis. Uma coroa de grampos na cabeça feita pelo grampeador. Um final digno para um estudante pagão temente ao conhecimento.

 
 

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