PORVENTURA
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Eduardo Prearo
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Ansiava por que a vida melhorasse e deixava de viver o agora. O relógio já era: o ponteiro vermelho dos segundos ia e vinha entre o três e o quatro, o ponteiro das horas ocultava o p da palavra panda. Eduardo Woox sentia-se um celerado, um homem sinistro sem nenhuma perspectiva. Mas também pra que perspectiva se o que valia era o aqui e agora, a consciência do próprio corpo? Eduardo Woox vestia-se mal, porém com as cores do próximo verão: camisa de jérsei púrpura e calça de brim verde-escura, tudo velho, de dez anos atrás. Já perto dos quarenta, não tinha direcção fixa por ser financeiramente mal equilibrado, por causa do esteriótipo que, segundo alguns, afastava as pessoas, e talvez por causa de...era bom falar, mas não. Amigos? Não sabia mantê-los, era um insensato. Um dia avistou um anúncio em um busdoor que dizia: " Empréstimo sem consulta ao SERASA e ao SPC". Eduardo Woox tentou anotar o telefone, mas o ônibus dobrou a esquina com uma velocidade anormal. Como limpar o nome emporcalhado se não permanecia por mais de seis meses em um emprego? Era tido como um psicótico e ficar muito bravo significava surto. Pisar no calo dele, portanto, era sempre sem querer. Aspirava à sanidade, à consciência, de forma doentia, aspirava a ela porque achava que rico doido não existia; devia ser elitista sem saber. Não havia religião superior à verdade, mas nem política? Política não é religião, não é? Não havia a compreensão de que seu pequeno desejo de viver era o bastante para a surra do mundo doer. Eduardo Woox escrevia poesia, versinhos livres de qualidade duvidosa, mas que eram dele mesmo...
Dirigi-me àquele cais em pensamento
Dirigi-me àquele vasto campo relvado no morro, Os dias melhores prometidos não se sabe até hoje por quem não chegaram, e os homens esputaram muito. Eduardo Woox só tinha inimigos, era tímido demais ou então extrovertido quando falava sem pensar. De qualquer forma, ninguém o ouvia e a populaça desconhecida e inatingível, um espírito-grupo, estava sempre satisfeita porque naturalmente devia conseguir pagar as contas dela e sabia de algo que ele, o ingênuo, jamais saberia. Os pitbulls e os seres com gens de pitbulls estavam soltos, e Eduardo Woox corria deles malucamente pelas ruas, assustando os donos dos carros, que pensavam que ele era um bandido ou coisa qualquer semelhante. Ah, pobre Woox. Lembrar-se-ia de 2005 como um dos piores anos de sua vida? Talvez, porventura nos momentos de lucubração futuros. Mesmo com as presenças de agora, sem defeitos, que davam lições de vida, havia esperança de que tudo mudasse. |
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