SERÁ QUE JÁ ESTAVA NA HORA?
Adriana Vieira Bastos
 
 

Não agüentava ver o relógio caminhando impassível à sua vontade. E com ele o prenúncio do fim. Fim da sua vida.

Por que era tão difícil a morte?, perguntava-se, alheia aos procedimentos médicos praticados sobre o seu corpo, quase que inanimado.

Primeiro fora a amiguinha do colégio. Depois, os avós. A tia. E, vez ou outra, alguém próximo simplesmente partia. O pior é que ninguém conseguia explicar o porquê desta traidora ausência, tão devastadoramente sentida.

E se não bastasse, com as constantes doenças da mãe, teve que aprender não só a encarar, como a conviver com esta "presença" soturna e ameaçadora sempre lhe rondando. Cada ano uma nova doença. Uma cirurgia realizada às pressas. E sempre o mesmo medo materializava-se.

Injusto!, quando criança assim pensava. Que Deus era aquele que lhe tirava aqueles que mais amava?

Sem resposta, e não sabendo o que fazer com a sua dor, passou a evitá-la. Ligara o "automático", e quando a coisa apertava, pedia um minuto. E de minuto em minuto, ela foi levando, a vida passando, até que não agüentou e explodiu...

Agora, prostrada no leito da UTI, escutava, dos médicos, indiferentes à sua alma assustada, o veredicto final - "Questão de tempo!".

Por isso desejava tanto que estivessem as horas paradas!

Mas estava fraca. Muito fraca. Suas forças esvaíam-se. Sua energia estava por um fio. Era puxada para um lugar que não conhecia. De repente, experimentou a paz. Nada mais lhe interessava. Fechou os olhos e gostou do que sentiu!

Leve e pronta para o desconhecido, viu o seu corpo caindo, caindo, caindo, até que... finalmente acordou assustada com o barulho do despertador, dizendo-lhe que era de manhã e teria um dia duro pela frente.

Atordoada, beliscou-se e percebeu que ainda tinha tempo nesta vida para rever o que andava fazendo consigo mesma. Respirou fundo, levantou-se, vestiu-se, tomou um gole de café e pegou suas coisas, pronta para enfrentar aquele que seria o "primeiro dia do resto de sua vida".

Feliz, pegou a chave, fechou a porta e saiu. Sentia que já estava na hora sim. Na sua hora de relaxar e entrar no clima daquela musica conhecida - "deixa a vida me levar, vida leva eu"...

 
 

fale com a autora