O VÍCIO DELE
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Thaty Marcondes
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Era uma vez Maria e João, João e Maria. Diálogo final do romance tórrido: - Preciso te contar um segredo, Maria. - Fala João. Sabe que pode confiar em mim: será o nosso segredo. - Maria, deixe-me falar, não me interrompe e nem peça que eu olhe pra você enquanto falo, pois é muito doloroso o que tenho pra confessar. - Credo, João, assim vou acabar pensando que você cometeu algum crime. Fez algo errado? - Maria, eu tenho um vício. Já tentei de tudo, já usei todas as fórmulas, todas as maneiras, mas não consigo largar. - Estou aqui pra ajudar, meu amor. Você sabe que pode confiar em mim. - Maria, meu vício é hediondo. Deixe que eu fale. - Já sei: você bebe escondido! - Não, Maria. Quem faz isso é sua avó. - Você tira caca do nariz e faz bolinhas na mão? - Não, Maria. Quem faz isso é seu irmão. - Você se masturba escondido no banheiro da minha casa? - Não, Maria. Quem faz isso é seu pai. - Você reaproveita comida estragada, nem que seja pra dar pro cachorro? - Não, Maria. Isso quem faz é sua mãe. - Hum... Deixe-me pensar. - Maria, eu posso falar? - Claro, que pode, meu bem. Não estamos aqui pra isso? Pra você desabafar e eu, como sua companheira, compreensível que sou, tentarei lhe entender e ajudá-lo no que for preciso? Você pode contar com meu apoio, meu amor. Fale. - Bem, Maria, é difícil até começar. - João, não me diga que você é homossexual? Ou melhor, bi... Pois conheço suas qualidades de homem. João isso seria abominável. Como eu poderia me deitar novamente com você? Ficaria imaginando você e outro homem! Ah! Não quero nem pensar nessa hipótese, mas se for isso, podemos tentar um tratamento médico, um psicólogo. A gente dá um jeito! - Maria, você sabe muito bem que bicha é seu tio solteirão que mora na sua casa! - Pois é. Seria demais você também gostar de homens. Dois, na mesma família! Eu não agüentaria esse choque! Já sei: você fuma de noite no quarto. Eu odeio isso, você sabe. - Maria, posso falar? - João, estou apenas tentando ajudar, mas você não fala! Conta logo, pois estou aflita. - Maria, você não me deixa falar! Dá pra calar a boca e me ouvir? - Nossa, João! Assim você está sendo indelicado. Olha como você me deixou: estou tremendo. Você me magoou. Isso são modos de falar comigo? - Mas você não fica quieta, Maria. Pelo amor de Deus! Vai me ouvir ou não vai? - Você agora se acha o dono da verdade? Tenho que ouvir seus absurdos e ficar quieta? - Maria, você está enchendo o meu saco! - Não senhor! Você encheu o meu. Não quero te ver nunca mais. Você e seus segredos, seus vícios. Só falta dizer que tenho mania de interromper você! E Maria sai batendo a porta para nunca mais voltar. João pensa em voz alta: - Nem me deixou fazer a surpresa: ia dizer que meu vício era ela e e pedi-la em casamento! O que faço com as alianças? Mulheres! Bah! |