MANIA DE SEMOSTRAÇÃO
Raymundo Silveira
 
 

Entrou, Idalina? entrou, seu João, tá faltando só a cabeça. Eu conheci os dois, mas não posso jurar que foi verdade. Entretanto, era público e notório que João Belizário tinha sessenta e cinco quaresmas. Diziam que por ter o sangue doce, tinha perdido a macheza. O homem não se conformava. Mulher para ele era como o próprio ar que respirava. E ele vivia o tempo todo sem fôlego. A humanidade é cruel. Se for um mutilado, um cego, um aleijado qualquer, todo mundo faz questão de ajudar. Mas quando se trata de gago, gordo, broxa, ou tiver qualquer outra mazela humilhante, Deus os acuda. Tive um colega de internato que tinha a cara de um macaco. As gargalhadas não paravam, as humilhações não tinham fim. Para onde o coitado se virava, ofereciam bananas, atiravam objetos grotescos, e gritavam: Macaco! Nunca soube o nome dele. Se algum dia nos encontrarmos casualmente pelas ruas, certamente vou reconhecê-lo e tratá-lo exatamente por chimpanzé, digo melhor, por Macaco. Pois não haverá outra nomeação que me ocorra. Tinha uma vítima que fraturou o cotovelo, e com o braço ainda engessado foi admitido na nossa escola. Passou dois meses sem se molhar. Até hoje ainda o tenho por fedorento, pois enquanto com ele convivi só o tratavam por essa graça. Quando adultos, guardamos esta crueldade - resquício da meninice. E ninguém hesita em humilhar gente com disfunção sexual - a velha impotência tratada do ponto de vista politicamente correto. Contam ainda do tal João Belizário, que numa das costumeiras noites, que por acaso eram todas, em que estivera com uma prostituta, acabara de despachá-la após duas longas horas de inúteis tentativas. Convém esclarecer que viagra, naquela época, soava do mesmo modo como sovaco de cobra, ombro de muçum e perna de lagarta. Pois bem, mal despachou a profissional, Belizário teve, juntamente com uma vontade imperiosa de defecar, uma ereção bissexta. Ao terminar de cumprir a necessidade que prescindia de parceria, a rigidez milagrosamente continuava. Ele, então cheio de ódio e desespero falou sozinho para o próprio pênis (Belizário, ainda por cima era meio gago): Tu... Tu... Tudo bem, já qui... qui... qui não quiseste co... co... comer caviar, agora vou te fazer co... co... comer merda. E dizem que não ficou apenas na retórica. Contam também que de outra feita, ele se encontrava nas tentativas frustradas de sempre com a dita Idalina, quando teve outra ereção fortuita. A prostituta, na ânsia de satisfazê-lo, apressou-o: Vamos logo, seu João, vamos logo, seu João, antes "quissacabe", vô... vô... vô nada, pri... pri... primeiro vou mos... mos... mostrar pros amigos lá fo... fo... fora, se... se... sobrar...

 
 

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