O NARIZ
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Osvaldo Pastorelli
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Encolhido observava. Doente era imperiosamente impelido pelo frio que cortante rasgava seu sentir. Ergueu a gola e puxou o zíper da jaqueta até o pescoço. Um contra o outro seus dentes batiam mais que liqüidificador no preparo da vitamina. Como elevador a temperatura do corpo subia e descia. Feito cascata seu nariz escorria mais que nabo temperado no molho pardo. A dor intensa pressionando sua cabeça para baixo, fazia sentir-se quebrado, como se o corpo pesasse uma tonelada. Com dificuldade levantava a cabeça. Imóvel, parado, extático era preciso e assim aliviar um pouco a dor. Lagrimejava vermelhos os olhos. Um suor frio ensopava sua camisa azul. O pior era os solavancos, as freadas, os balanços que o ônibus imperioso dava. Surgiam pontadas nas costas como se pequenas agulhas penetrassem na carne. Noção não tinha de quantos rolos de papel higiênico consumira. Não tinha mania de se assoar em lenço. Credo! Lenço!? Nojento aquela mancha dura, ressequida, placa verde endurecendo o pano. Argh!! Náusea fazia seu estômago regurgitar a comida do almoço. Feito pimenta no tempero da carne assada o nariz vermelho queimava. Delirava. Seu conteúdo, vazio sem se fixar em nenhum lugar, o pensamento varejava como mosca sobre a podridão. Um torvelinho na sua cabeça transitava estagnado a meio caminho de casa. Ainda bem! Começou a achar-se esquisito ao perceber que percebiam seu estado doentio. Notou que se afastavam dele como o cão da cruz. A noção de algo acontecido tomou forma alucinada na mente. O que houve? Ousou seu pensamento gritar. Afastam-se de mim como se lepra eu tivesse? Resolveu não dar pelota no acontecido. Desceu do ônibus e se pôs a caminhar rente a parede. Desconfiou que seria apedrejado se não saísse dali. Nisso passava em frente de um espelho. Parou. Olhou seu reflexo no espelho e viu. Horrorizado constatou que estava sem o nariz. Sem notar jogara fora junto com o papel higiênico. No lugar estava só um enorme buraco onde a meleca gosmenta boiava no respirar angustiante. Sentiu acelerar o coração caindo morto. Ninguém deu pelota ao pobre homem estirado na calçada. Apenas um cachorro vira-lata, talvez faminto que se pôs a lamber o nojento buraco onde era o nariz do coitado. |