O POÇO
Bárbara Helena
 
 

Você olha o fundo do poço. Ele se perde lá embaixo num quase brilho que parece água porque ondula. Como o tempo. Você pensa no tempo ondulante para tirar a mente da água onde cairá depois de alguma resistência.

Você discorda desta afirmação, não vai ser vencido. Mas seus dedos estão em carne viva de se agarrar às pedras úmidas do poço. E os olhos, cansados de varar a escuridão, voltam-se para o alto. Conseguem ver a forma circular da borda e as estrelas boiando nela. Você pisca e elas se fixam. Um círculo perfeito que significa salvação. Você ainda pode ver estrelas.

Não quer olhar para baixo, mas faz isto. O abismo se abre, negro. Você sente os braços doloridos, os músculos não agüentam mais sustentar o corpo, sabe que é questão de minutos. Não, você não aceita esta frase, tem coragem.. Bate as pernas, tentando achar um apoio. Se conseguir firmar os pés, poderá descansar.

Você escorrega pela parede de limo, se apavora, mas seus pés encontram uma pedra saliente e se apóiam nele, com a ajuda das unhas cravadas na parede. Você apóia os pés e traz os braços dormentes para baixo. Faz isto com dificuldade, seus tendões e músculos estão uma pasta de dor e rigidez.

Cola o corpo no poço e fica alguns minutos assim, repousando, apesar da posição incômoda. Seus pés estão ficando dormentes e sabe que precisa tentar subir ou estará perdido.

Vasculha o negrume, procurando outros pontos de apoio. A lua aparece na beirada e ilumina as paredes. Você suspira de alivio: há algumas pedras salientes e talvez consiga escalar. Respira fundo, enche os pulmões de ar, concentra toda a energia. Suas mãos se estendem ao máximo e agarram a primeira pedra logo acima. Com cuidado, você se apóia nela, iça seu corpo, num esforço absoluto e fica pendurado, balançando sobre o abismo.

Você se esforça ao máximo, as veias intumescidas e, num impulso, consegue que seus pés se firmem na parede.

Estende a mão para a outra pedra e escala o poço devagar.

Os braços doem terrivelmente, mas você nem sente. Toda sua mente está concentrada em subir.

Você olha para cima e vê que a lua já ultrapassou a metade da borda. Logo ela terminará seu passeio e a escuridão impedirá que escolha as pedras para se firmar.

Você fica nervoso, sobe com rapidez, os pés escorregam, você quase cai, mas consegue se apoiar. A borda está perto da sua cabeça, falta pouco para a liberdade. Você reúne as últimas forças dos seus braços e pernas esgotados e se pendura na última pedra saliente...

Então, com o coração batendo terrivelmente, você levanta o corpo e sua mão segura a borda do poço.

Neste momento, seus pés escorregam no limo, você perde o equilíbrio, suas mãos largam a pedra, seus braços tentam se agarrar a algo. Eu faço com que encontrem o vazio e seu corpo caia para a morte.

Sinto muito, mas o escritor sempre vence no final.

 
 

fale com a autora