FERIDA ABERTA
|
Lena Chagas
|
Em um dos poemas de Florbela Espanca há uma conclusão que diz: "Que um engano feliz vale mais Que um desengano que nos custa tanto!". Vem a calhar. Estava em estado de graça. Uma satisfação muito grande e uma paz interior tomaram conta de mim e é difícil de explicar, pois ao mesmo tempo, parecia que eu ía explodir de alegria. Um
sorriso colou no meu rosto e várias vezes me flagrei sorrindo em
hora imprópria - para os outros - ou sozinha. Não, não era efeito de droga ou coisa parecida. Era real, estava acontecendo mesmo. E tudo começou no momento em que me senti acreditando naquilo em que até então duvidava. Mas não foi algo imposto ou programado. Fluiu com tanta naturalidade, que nem me ocorria procurar explicações ou questionar. Era como se houvesse uma redoma que me envolvia e filtrava qualquer possibilidade de dúvida. A atmosfera era de puro encantamento. Qualquer adversidade - que em outro momento provocaria no mínimo alguma reclamação - era motivo para riso ou não tinha a menor importância. Mas tudo o mais era da maior importância. Tinha uma vontade enorme de dividir com todos aquela sensação, mas obviamente não seria entendida se tentasse. A racionalidade agonizava, mas ainda dava seus palpites! Ou já estava no caminho de volta? O fato é que, aos poucos, a normalidade foi mostrando a forma trivial das coisas e vi que meus pés já estavam plantados no chão. Foi aí que eu percebi que havia experimentado a felicidade. Aquilo era felicidade, com certeza! Nada mais, nada menos. Por pouco tempo, mas senti seu gosto, seu cheiro, sua delicadeza e sua generosidade. Mas não foi preciso muito tempo nem muito esforço para eu constatar que havia acreditado em uma inverdade. Senti o gosto amargo do desengano. Mas dessa tristeza não falo. Ainda sorrio quando lembro da mentira que me fez feliz! |