TUA, E MINHA
Eduardo Sales
(Duninja)
 
 

Um e oitenta e dois, pardo, lábios finos e olhar dissimulado. Sobrancelhas protuberantes e bigode ralo. Aparentava ter pouco mais de trinta e emanava uma voz rouca e aguda.

- E por que atirou?

- Ao me defender, apertei uma enorme ferida em seu cotovelo, ele não gostou.

Às vezes Pupo age sem saber. Seu movimento parece soprado pelo que vem e o atinge, não pelo que ele é. Mas o que é, Pupo reconhece que não te pertence. Seu movimento, acha, só pode vir se for dos outros. Logo convida, o não tão morto, Science: "O mundo é uma cabeça, e eu, quero ser sua seborréia..."

"Mas ser diferente é fugir da natureza, da essência, da dor. Então, vou entrar nessa e tomar o que é meu por natureza, a sua ferida, aquela que o mundo fustiga e 'afunda' o pé." Que bom que Pupo só vê vantagem nisso. Talvez pelo efeito colateral que ela, porventura, possa provocar. Aí, plantam, os outros, o que é seu, a ferida e a dor da ferida... E o grito agudo, conseqüência.

Diria Pupo, o enfaixamento é ruim porque demora a cicatrizar e protelar essa situação seria idiotice, ao cubo. Mas, diria a onisciência: arriscado seria deixar descoberto e, por pus, o recriminaria sua namorada, seu corpo da noite, sua via de fato. Pode acontecer de inflamar e, você sabe. "Adeus, meu bem"!

No dia de Ação de Graças, que não é e nunca foi comemorado por aqui, inventou de dar graças a Nhô Preto, uma lenda fulgaz. Mas antes, o que acontecera?

Nada importa, a ferida é dele, não sua. Desculpe, é sua também. Se o mundo for uma cabeça... E todos? Somente caranguejos?

"Não agüento mais... Essa coisa dói na alma, nem mais no corpo. Agora eu me mato, agora sim... Ahh..." Contenha-se Pupo! Engula essa dor, beberrão! Ela é sua, somente sua, seu pamonha, imbecil! Alegra-te, Pamonha!

"É tua também!" - rebate Pupo.

 
 

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