SILENCIOSA FERIDA ABERTA
Daniela Fernanda
 
 

Quando soube, que o homem com quem vivera durante os últimos quinze anos da sua vida, alugara um mega apartamento na cidade vizinha, para morar com a vagabunda que fora o pivô da sua separação; não teve dúvidas, entrou no seu carro e dirigiu-se até lá o mais rápido que pôde.

Durante o percurso, pensava em todo o sofrimento que estava vivendo naqueles últimos quatro meses. Lembrava-se bem, da noite em que a vadia havia ligado para o seu lar, até então imaculado, e com ar debochado e demoníaco, destruiu em segundos a felicidade da sua família. Ainda hoje, a dor era insuportável. As marcas da maldade e da traição eram visíveis. Perdera quatorze quilos, envelhecera muito, não dormia quase nada, pouco se alimentava, não sorria mais; apenas chorava.

Agora estava lá, enfrente ao prédio, e aproveitando que o porteiro abria a porta para outra pessoa, empinou o nariz e passou reto, sem ao menos olhar para o lado. Entrou no elevador, apertou o número do andar ... e o coração disparou... Sentia a pulsação no pescoço e nos ouvidos, suas mãos estavam suadas e ao mesmo tempo congeladas. Não desistiu. A porta do elevador se abriu. Deu três passos lentos, porém firmes, até a porta do apartamento e tocou a campainha. Percebeu movimentos do outro lado da porta. Seu peito doía. Então viu a sombra se mover até o olho mágico, mas ninguém respondeu. Bateu de novo, novamente, mais uma vez, várias vezes, e nada.

Olhou ao redor e viu um vaso enorme, cheio de terra, com uma arvorezinha plantada. Levantou-o, sem saber como teve a força necessária para tal atitude, e arremessou-o contra a porta.

Abre-se o elevador e de lá sai o porteiro. Abre-se uma outra porta do corredor, e surge uma moradora com o rosto pálido de susto.

A esposa traída na verdade nem vê, e tenta inutilmente, com o seu próprio corpo, arrombar a porta. Recorda-se
de repente que trouxe um martelo em sua bolsa. Martela agora, toda a porta. Destrói literalmente a maçaneta e finalmente é agarrada pelo porteiro que a arrasta para o interior do elevador.

Ao chegarem no andar térreo, o porteiro treme mais do que ela. O serviçal pede a alguém um copo d'água e faz, delicadamente, com que ela o beba. Sem dizer palavra alguma, a esposa traída, deixa o prédio e dirige-se ao seu automóvel,mas não sem antes olhar para trás e para cima.

Lá na janela do oitavo andar, está à piranha a lhe abanar, como se fossem velhas conhecidas. Alguns anos já se passaram e até hoje a esposa pode dizer que se o tempo apaga todas as coisas, desta vez ele se esqueceu de apagar.

 
 

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