OLHAR DE HELENA
Carlos Bruni
 
 

Foram tempos tristes. Tempos cinzentos, de homens duros e suas almas corrompidas. A prepotência dominou-os e interesses mesquinhos violentaram a vontade das gentes. Foram tempos de mistérios, de sangue e de nenhuma explicação. Ou de explicações que a eles convinham.

Helena viveu esses tempos. O azul-mar de seus olhos fazia contraponto àquela escuridão. Mas trazia, também, um mistério abissal.

Quando ela chegou à cidadezinha, instalou-se num antigo casarão ao alto da rua de calçamento de pedras pé-de-moleque onde, por horas, debruçava-se à janela numa espera angustiada. Fossem outros os tempos e alguém diria ser ela a musa de algum poeta lá das Gerais.

Não era. A candura de seu olhar contrastava com a dor que trazia no peito.

Ela teve, souberam, seu homem arrancado dos braços e levado por figuras sem rosto, sem nome, soturnos como aqueles tempos. Levado dali, nunca reapareceu.

Em seu desespero, Helena bateu em portas, percorreu salas escuras e corredores tortuosos. Questionou, suplicou, sempre em vão. Aos poucos foi perdendo a luta da procura por idéias desaparecidas nos porões dos homens.

Helena postou-se à janela numa longa e vazia espera. Os dias foram caindo folha a folha, e ela sempre debruçada no peitoril. Derramava pela rua a tristeza de seu olhar; os longos cabelos faziam-se de cortinas a emoldurar o rosto alvo e desciam até as bordas dos seios redondos.

O segredo maior aos poucos revelou-se. Em seu ventre ficara uma semente que germinou, cresceu e floriu.

Helena colheu aquela flor, fechou a janela e partiu.

 
 

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