REUNIÃO À MEIA-LUZ
Cristina Del Nero
 
 

Aos 10 (dez) dias do mês de maio de 2005, às 21 horas, no salão de festas do Edifício Miramar, situado à Rua Prudente, nº 16, reuniram-se em Assembléia Geral os condôminos Sr. José, da unidade 42, Sra Dalva, da unidade 52, Sr. Carlos da unidade 112, Sra. Valéria, da unidade 62, Sra. Kátia, da unidade 12, Sr. Valdomiro, da Unidade 72, Sr. Osório, da unidade 22 e Sra. Maria Luiza, da unidade 82.

Feita a abertura dos trabalhos, os senhores condôminos indicaram para a Presidência da mesa o Sr. José, da unidade 42, que convidou a mim, Ismael C. Santos, representando a Administradora responsável pelo condomínio, para secretariá-lo. Aberta a sessão o Presidente leu em voz alta a "Ordem do Dia", cujos itens específicos foram a conclusão das obras da garagem e a pintura do edifício. A Sra. Kátia, da unidade 12, pediu a palavra para dizer que o ladrilho escolhido para a garagem era um dos mais cafonas que ela já havia visto. Ao que o síndico, o Sr. Valdomiro, respondeu que o mesmo havia sido escolhido em Assembléia Extraordinária, realizada no dia 12 de fevereiro de 2005, a qual a Sra. Kátia não estava presente. Em resposta, a Sra. Kátia disse estar ciente, porém, quis deixar a sua insatisfação registrada. Isso posto, foi decidido que os canos e as paredes da garagem deveriam ser pintados para finalizar a obra. Encerrado o assunto da garagem, abriu-se a discussão da pintura do edifício quando, de repente, as luzes se apagaram. Após alguns segundos de silêncio, o Sr. Valdomiro decidiu ir até a portaria para se informar sobre o ocorrido, voltando em seguida de posse de uma lanterna. Pedindo a palavra, o Sr. Valdomiro informou a todos que um gerador do bairro havia sofrido um curto-circuito e que, segundo lhe foi informado pelos orgãos competentes, a luz só seria restabelecida após a troca do mesmo. Perante esse problema, fez-se necessário uma votação extraordinária para decidir se a reunião de condomínio seria cancelada ou não. Todos votaram a favor da reunião, já que ninguém estava disposto a subir vários lances de escada. Com a única lanterna disponível colocada na mesinha de centro, foi reiniciada a reunião e o assunto em pauta voltou a ser a pintura do edifício. O Sr. Valdomiro disse ter 3 orçamentos em mãos, mas que naquele ambiente à meia luz, não teria condições de apresentá-los, mas podia adiantar que o mais barato havia ficado em 40 mil reais. Quase todos disseram Meu Deus. A seguir o Sr. Carlos pediu a palavra para perguntar se as empresas cotadas eram de confiança, ao que o Sr. Valdomiro respondeu que sim e que tinha, inclusive, recebido indicações dos prédios vizinhos. Esclarecida essa dúvida, o Sr. Valdomiro começou a explicar detalhadamente como o serviço seria feito, porém foi interrompido pela Sra. Maria Luiza, que com a palavra pediu que a pessoa que estivesse com a mão sobre a sua coxa fizesse o favor de tirá-la, já que além de casada, ela era uma mulher de respeito. Ouviu-se em seguida um riso nervoso, que foi interrompido pelo pedido da palavra do Sr. Osório, que expressou suas desculpas dizendo ter pensado que a coxa da referida senhora fosse o braço do sofá. Quase que imediatamente, a Sra. Maria Luiza perguntou ao Sr. Osório se ele a estava chamando de gorda, uma vez que era de conhecimento de todos que os braços do sofá eram bem largos e fofos. Antes mesmo que o Sr. Osório respondesse, a Sra. Dalva pediu a palavra para comentar que a Sra. Kátia estava querendo arranjar encrenca, ao que o Sr. Valdomiro acrescentou que todos ali eram pessoas educadas e que o assunto deveria ser encerrado. Porém, antes mesmo que o Sr. Valdomiro terminasse a sua frase, a Sra. Kátia retrucou o comentário da Sra. Dalva, dizendo que ela não deveria se meter, apesar de todos saberem que ela adorava bisbilhotar a vida alheia. O Sr. Valdomiro, mais uma vez, tentou pedir a palavra, mas foi interrompido pelos gritos da Sra. Valéria que, tomando partido, disse que a Sra. Dalva deveria cuidar mais da sua vida e ficar de olho em seu marido, que vivia beslicando as nádegas da sua empregada doméstica. Descontrolada e sem pedir a palavra, a Sra. Dalva disse que não levaria em consideração o comentário de uma biscate desclassificada. Antes que a reunião se transformasse num espetáculo grotesco de vale-tudo, o Sr. José bateu com a mão na mesinha de centro, fazendo a lanterna voar longe e se desligar. No escuro, seguiram-se insultos mútuos, tais como rampeira, tarado, estelionatário, gorda, frustrada, mal amada e barraqueira. Em meio a confusão, o Sr. Valdomiro conseguiu religar a lanterna. O Presidente da mesa, Sr. José, pediu calma e um pouco mais de educação, quando foi atingido na cabeça por um sapato.

Nada mais havendo a ser tratado, e com a polícia invadindo o salão de festas, considerei encerrados os trabalhos e lavrei a presente Ata.

 
 

email do autor