CONFISSÃO
Juraci de Oliveira Chaves
 
 

"Preciso confessar este segredo antes do casamento".

Era um pensamento que não saía da cabeça de Layane. Volta e meia, na lida de arruma enxoval, as marteladas batiam cada vez mais forte em sua consciência. Sabia do amor que o noivo a tinha mais do que isso era impossível passar por um vexame deste porte. Poderia até ser menos ruim ficar calada, jamais ele a perdoaria ou conseguiria viver um só momento a dois depois da confissão. A bem da verdade, num mundo moderno, isso poderia ter sido deixado de lado, mas para Hebert certamente tudo terminaria em catástrofe. Falta de amor? Não, o amor existia sim, mas não a ponto de aceitar o inaceitável. Precisava encontrar a palavra e a hora certa. O fato em si a inquietava. As frases deveriam ser pensadas e bem construídas para não provocarem embaraços e efeitos impactantes. Impactantes porque ele acreditava ter escolhido a única entre todas.

Precisava somente encontrar o entendimento, o apoio ao toque de mãos que tudo dizem, que tudo perdoa. Queria aquele olhar que a perdoasse que a seguisse mesmo nos seus erros de adolescente.

Precisava de mais tempo, mas a tarde se findava e tudo em si, até o fio de cabelo que lhe caía sobre a testa estava num pé só de nervos. O dia estava chegando, aliás, seria amanhã. Não podia mais adiar aquela confissão. Mesmo sendo um martírio. Havia chegado a hora.

Nem preparou o ambiente, as palavras. Quando Hebert arrastou a almofada sobre o tapete e acomodou o corpo para assistir o jogo de futebol do time preferido ouviu a queima-roupa:

- Eu tenho uma filha de 10 anos. Abandonei-a no dia em que nasceu e fugi para cá para nunca mais lá voltar. Eu era uma menina cheia de dengos. Foi uma menina gerando outra menina. Não podia ficar lá. Costumes rígidos, mulheres beatas, saias compridas, mangas longas, corpo todo coberto de meias, anáguas, fechadas para o mundo, para a vida... Eu tinha meus sonhos... Meninas tinham sonhos... Quis quebrar paradigmas antigos, mas quebrei foi a cara... Conheci você e pensei em recomeçar do zero, sem mentiras, sem segredos...

O silêncio foi eterno até a almoçada atiçada com força e raiva quebrar o vaso de porcelana, repleto de rosas vermelhas.

Dia triste aquele para Layane.

Enquanto uma última lágrima chorava em seu olhar esperava pelo olhar dele novamente. Um dia quem sabe?

 
 

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