- "Vamos Magrão, caralho, arma essa porra direito!"

Impressionante como o stress vai embora logo no primeiro minuto de jogo. Embora? O stress do trabalho realmente se vai, assim como o do trânsito e das obrigações. Mas eles dão lugar à preocupação com o time e àquela gostosa sensação de responsabilidade, que o resultado de alguma forma depende de mim.

- "Joga no Christian! Aparece, porra!"

Vestido com a camisa do Palmeiras, em pé em frente à mureta da arquibancada, separado do campo apenas pelo fosso do estádio Palestra Itália. A chefe não está por perto. Sequer me lembro dela agora, muito menos das tarefas que ela teima em me passar.

- "Vai pra cima, Lúcio! Vai até a linha de fundo pra cruzar!"

O placar anuncia um gol sofrido pelo maior rival em outro jogo da rodada. A torcida comemora. Eu, não ligo. O futebol pra mim é um passatempo, uma fuga dos problemas da vida real. É ótimo, por pelo menos duas horas, trocar...

- "Joga no meio! No meio! Chuta Pedrinho! UUUUHHHHHH.... tá bom, tá bom, é por aí mesmo..."

... trocar as preocupações rotineiras pela simples torcida. É ótimo saber que posso ficar feliz com algo que simplesmente não depende de mim. Não depende! Se o time ganhar, ficarei feliz, e isso é ótimo. Se perder, a culpa não terá sido minha. Paciência. Se o outro ganha ou perde, pra mim é indiferente. O resultado do meu time é o que importa.

- "Candinho! Caralho! Quanto tempo você vai deixar o morto do Marcel em campo? Ficou louco?"

Intervalo. Divertido ver as figurinhas que vão ao estádio: crianças, idosos, "tios" barrigudos, mulheres, pessoas que sabem tudo, pessoas que ficam o tempo todo fazendo perguntas pra quem ao menos sabe quem está jogando e qual a competição. Não gosto das organizadas por motivos óbvios, e quem vai aos jogos sabe muito bem que motivos são estes. Fico longe, sequer olho para os integrantes, e não participo dos gritos de guerra.

Os times voltam:

- "Vai pra puta que pariu, Candinho! Estamos perdendo, temos um homem a mais e você mantém os três zagueiros em campo? Vai se foder!"

A bola vai, a bola vem. Fico revoltado, comemoro. Xingo, incentivo. Amaldiçôo, aplaudo. No final temos o resultado de noventa minutos de futebol. Se vai ser campeão ou se vai cair pra segunda divisão, eu não sei. Ganhando ou perdendo eu parto tranqüilo, agradecido pelos momentos de diversão e sossego, com o coração cada vez mais verde.