TOQUES NA PORTA
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De repente toques na porta. Escuto. Toques suaves novamente. Parece alguém apressado. Vou abrir a porta mas antes, uma olhada do visual no espelho. Tudo bem. Abro a porta e um susto: - Com essa chuva! Já ia me deitar, sabia que não viria. Um olhar másculo e nenhuma palavra. Não precisava das palavras naquele momento. O silêncio era parceiro. A porta bate puxada pelo vento. Um abraço, um cheiro molhado e a capa de chuva jogada para um canto. Era sempre assim. Chegava como se viesse do nada. Saía deixando um mundo repleto de amor. No começo, não queria mas depois, já não sabia sair desse emaranhado de armadilhas com incógnitas impossíveis de se desvencilhar. Fui pega por uma daquelas redes de prender sereias em noite solitária de luar encantado. Ele era um homem diferente, falava pouco, sorria delicado, olhar de vítima enjaulada. Assobiava bonito como um pássaro preto do sertão. Era como um magnetismo daquele que faz arrepiar até a alma. Eu já estava querendo sono mas aquele olhar me fez desejar colchões de sonhos, de palavras sussurradas ao ouvido arrancando arrepios desnorteados. Um passo cambaleante, o sofá estremeceu com o peso em desalinho. O sono enamorou-se do luar que meio tímido empurrou a chuva para outras bandas empoeiradas, mais carentes de terra molhada. Aspirando meu corpo trêmulo, monólogos, mostrou-me caminhos ondulados e desconhecidos. Ele segurou-me pela cintura e beijou suavemente os cabelos que eu soltara, alisando com a língua os cachos ondulados. - Diz alguma coisa, você está tão calada! Há algo errado? Não disse nada. Deixei-o me conduzir ao som da música que vinha da danceteria do outro lado da rua. Dançamos agarradinhos até o quarto e nos tornamos a enrolar nos grandes lençóis de cetim embranquecidos. Eu não queria, mas quando dei por mim já estava em seu paraíso azul. Inventos novos e me tornou selvagem, tigresa da mata virgem, pantera do agreste. Aos poucos com o seu respirar no meu corpo nos adormecemos de mãos e pernas entrelaçadas, sem palavras. O silêncio dizia toda a nossas juras. E naquela noite encontrei a paz em cantos de cigarras invisíveis dentro de mim. Momentos marcantes mesmo que inconstantes, passageiros. Depois, ouvi o silêncio se movendo, sombra e passos distanciando e nova espera da próxima vez. Eternidade! Espera longa eu sabia. Muitas noites e aquele resto de noite seria mais um em que o sol demoraria para expulsá-lo. Só as estrelas a entrarem pela janela aberta. Até a música parou. Espraiavam no céu, nuvens carneirinhos desmamados e a lua mal escondida entre elas. Um vento leve busca o meu gemido impregnado de prazer e tristeza. A cama cheia de lembranças aguarda a próxima vez. |