DE CORPO E COPOS
|
|
O
corpo jazia, inerte, em meio aos copos espalhados no aposento. Cálices-testemunho
de um amor também moribundo. Ou, quem sabe, natimorto. O copo vazio
vazava esperanças, ecoando a lembrança amarga de um remédio
que se sabe veneno, mas que ilude os incautos. Sangrias jamais estancadas,
no olhar das sanguessugas que acenam sua vampiridade. Bebera seu derradeiro
gole, erguendo a taça, num brinde a um interlocutor inexistente.
Estalara a língua, no gosto acridoce das utopias-serpentes que
acalentara e que agora lhe mordiam o calcanhar. Não matara a cobra,
nem tampouco havia a quem mostrar o pau, como se diz na gíria,
mas o copo meio cheio - ou seria meio vazio? - apresentava os vestígios
da saliva que o veneno começava a produzir. Iria embora, não
para Pasárgada, pois não queria ser amigo do rei, mas o
plebeu que lhe usurpa o trono. Não iria para Minas, tampouco. E
agora, José? O corpo jazia, inerte, inerme, em meio aos copos espalhados no aposento. |