O DO CAFÉ
|
|
Havia um tratorista contratado pela Prefeitura de Quixadá reparando algumas estradas secundárias e veredas da zona rural. Mas acontece que, no sábado, ele sofreu um ataque cardíaco fulminante. A família do tratorista, após ser informada do acontecido, somente pediu ao prefeito de Quixadá que ele pusesse o corpo em um ataúde e que desse um jeito de transportar-lo até Fortaleza, para que ele fosse sepultado lá. Sobrou para Camargo, assessor do prefeito para assuntos diversos. Cidade pequena; tudo difícil. O assessor conseguiu um ataúde sabe lá onde; nem sonhou em lograr um atestado de óbito que o fórum, o posto de saúde e mesmo a delegacia fechavam no fim de semana; e, dos cinco carros da prefeitura, quatro estavam quebrados e o último estava sendo usado pelo prefeito. O jeito foi pegar seu próprio carro para fazer o traslado do corpo até Fortaleza. Tirou o banco traseiro da Rural e acomodou o caixão lá. Tacou-se para Fortaleza antes que o defunto começasse a feder. Contudo, no meio do caminho havia um posto da polícia rodoviária. Com um sorriso matreiro nos lábios, o guarda mandou Camargo parar. Carro velho, sinal que o do café estava para sair. O guarda pediu documentos, examinou todos os faróis, verificou pneus, observou limpadores de pára-brisa, conferiu o extintor de incêndio, certificou-se dos cintos de segurança: tudo na mais perfeita ordem. - Inteira esta tua Rural - comentou o guarda, triste por não ter encontrado nem problema de ferrugem no carro de Cardoso; triste por não ter como ganhar o do café. Camargo recebeu os documentos de volta e já havia dado partida no carro, quanto escutou o guarda novamente. - Só mais um momento - o policial estava novamente comum sorriso matreiro nos lábios. - O que é que carregas aí? - Estou levando este corpo para Fortaleza. O defunto será velado e enterrado hoje. - Cadê o obituário? - Não tem - o assessor gaguejou, um pouco nervoso. - Então não há como seguir. Cardoso já entendera o que o policial queria, porém, o assessor era feito de uma forja antiga, que não gostava de trapalhadas. Não iria dar toco para policial algum. Ele desceu da Rural, abriu a tampa traseira do carro e solicitou uma demão ao guarda. - Dá para o senhor me dar uma força. Segura as alças do caixão deste outro lado. - Que pretendes fazer? - Foi a vez do policial gaguejar. - Vou deixar o defunto aí contigo! - Por quê? - Não está tudo certo com a Rural? - Está! - Não é o defunto que está irregular? - Exato. - Então tu somente podes apreender o finado. Fica aí com ele que eu vou com minha Rural avisar a família do morto que hoje não dá para ter enterro! - Homi, pegue o falecido e vá simbora - implorou o policial, quase dando o da vela do velório. |