DESPINDO O DEADLINE
Bruno Pessa

Me escute bem: sou jornalista. É, aquele que vive assinando retratos cotidianos entre o anunciado condomínio dos sonhos e a página virada que logo vira bola-ao-cesto-de-lixo. Pago para apresentar um cartão de visitas claro, conciso, coerente e completamente condizente com o que você procura num texto – mesmo que, em matéria de pesquisa, você discorde do que o mercado postule de sucesso em termos de matéria. Não importam suas réplicas. Se vendo credibilidade para as pessoas certas, quem ousaria dizer que estou errado?


A cadeia não tem nada de equilibrada, como tudo que funciona no ecossistema capitalista. Agora sou o operário tragado pelas breves notas informativas que têm de entrar ainda hoje; ontem, que nada vale a ninguém, eram as aspas do especialista me abrindo um vazio justo na hora do fechamento. Como bancar o esperto sem um experto de nome e renome? Conformemo-nos: fonte não é qualquer bica. Por mais que os pipoqueiros sejam mais que figurantes no cenário do parque, há de haver uma direção para sentar na melhor poltrona.


Atar-se à agenda das telefontes é fazer o dever como a tia manda. Os grilhões que de fato machucam ocultam-se na suavidade fonética de um estrangeirismo intocável como deadline. Em seu nome, a apuração nem sempre cobre lacunas, as fontes nunca soltam tudo que sabem, os personagens não rendem como poderiam e o texto dava para sair melhor. Mas se não disser algo ao leitor amanhã mesmo, haverá quem o faça na prateleira mesma da banca...


Consciência calada com certeza alavanca a carreira. Adjetivos, juízos e ironias podem ficar em casa, porém a redação ainda produz mais que meros adornos da rainha publicidade, moldados pelo relógio-rei. Quando resistir no jornalismo significar lutar somente contra o tempo, que o exército fuzile este soldado do contra.

 

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