GALÕES DE SONHOS
Juraci
Sol nascente no horizonte. Dia claro. Lida
diária. Todos se levantam para o trabalho.
Vida de campo. O trabalho é duro sol causticante. Suor no rosto, corpo
cansado. Os olhos choram sobre a seca braba. Faz tempo, não
chove. As vacas, pouco leite, cooperativas querem cumprimento de contrato. Para
deixar o leite no ponto, viagem longa, cavalo cansado e eu também. Muitas
das vezes chego atrasado, o trem já passou. Hoje foi um desses dias.
Espero o ônibus que vem lotado de gente e de sonhos. Não há
passagem. Discuto com o motorista, comigo mesmo e com o cavalo. Até com
as vacas que agora dão pouco leite. Vida rala no pasto. Volto pra casa,
pego a furreca velha e tento levar o líquido branco para
a cooperativa da cidade grande.
Gente pra lá e pra cá, correndo pra todos os lados e eu me espalho
entre elas, gente sem alma, sem emprego e sem sonhos. Ausentes. Imigrantes alienados,
pedaços de vida, muitos fugindo da seca, da fome, do desemprego, diferentes
de mim que insisto em ficar, definho, quero vencer no campo onde finquei raízes.
Encosto a geringonça, desço os galões e um susto! Tudo
lacrado, só a placa:
Concordata.
O chão some sob os meus pés. Pernas bambas, suor pela face. Sento-me
sobre os galões, grito, esmurro.
-Como farei para honrar os compromissos? E o leite? Por que não me avisaram
antes sobre essa decisão?
(...)
Cai a noite, despenca toda a minha vontade de vencer. Destampo os galões,
um a um. Cheiro ruim. Leite cortado. Choro a desgraça. Em protesto espalho
o líquido sobe o calçadão da cooperativa. Com ele minhas
esperanças.
Saio em passos lentos, cansado, cabisbaixo carregando meu desespero e meus galões
vazios...
Morre o desejo de vencer no campo, já penso em mudar pra cidade e aumentar
a fila dos procurando emprego.
Volto pra casa. A claridade da lua me consola.
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