MAC & BETH
Eduardo Prearo
Prasanta ia ao Instituto vez ou outra, mas não só para visitar Abigail; ia também para apreciar os jovens dinossauros. Naquela manhã de quinta, ficaram ambas as duas admirando o nascimento de um filhote de Heterodartosaurus Tucki: o ovo azul ia se quebrando aos poucos sobre a grama e Abigail logo notou que se tratava de uma fêmea. A bichina, toda empertigada, pareceu sorrir para Prasanta, que recuou fascinada.
- Abigail, saí dessa! Isso de clonagem, sei lá o que, é ilegal. Já não basta essa inexplicável aurora boreal, essa imigração em massa de estrangeiros.
- De alienígenas.
- Não fale assim, Abigail. Você não tem agora até um namorado estrangeiro?
- Sim, Rupert deixa. Divirto-me ao léu. O mundo lá fora está mais assustador, querida. Você está impressionada, não é? Mas são coisas que mais cedo ou mais tarde aconteceriam. Por que não trabalha aqui comigo?; poderia ser minha assistente. Rupert e eu já estamos na fase final de pesquisa para o L1XT de um tyrannosaurus Rex.
- Não, por obséquio. Isso me apavora.
- Mas você nem tem um emprego no momento. Vive por aí com a renda de sua herança. Uma hora acaba! Por favor, não acenda isso aqui, querida. Pode assustar a bichinha. Como você tem problemas!
- Estou vendendo bem os meus doces. Futuramente quero abrir uma doçaria.
- De açúcar estou fora. Olha pra ela, que graça! Não pára de olhar para você. Vamos, dê um nome para ela.
- Tá bom, tá bom. Que tal Beth.
- Hum, nome de gente. Um nome bonito. Por que não faz um curso de teatro. Faz tão bem a mendiga lésbica! Seria uma ótima atriz.
- Tchau!
Quedrú, quedrú, quedrú. A lua raiou e Prasanta ficou mais de uma hora contemplando a paisagem ali de seu apartamento. Como os navios iluminados eram lindos!, pareciam jóias. Abigail queria que Prasanta cuidasse de Beth. Que idéia! Não, era loucura. E se os vizinhos descobrissem haveria pânico, cadeia. Seria o fim do mundo. Ninguém estava preparado.
Pela manhã, Bastiana acordou Prasanta como de costume.
- Bom dia, Dona Prasanta. Tem um senhor aí, um tal de Eduardo...
- Fale baixo. Ah, um que até convidei para morar comigo. O que será que ele quer depois de tanto tempo?
- Ele é meio calvo, sabe. Irra! Parece que achou a senhora bonita e a quer para estrela de seu partido.
- Diga pra passar amanhã à tarde, por obséquio.
- Bentinho está cuidando de meu bebê.
- Tire-o da favela. Pra que esconder essa história. Seu Bentinho não merece!
- Hoje vou pegar meu bebê, disfarçada. Que tal de cigana?
- A senhora é criançola mesmo, hein!
Depois de umas duas horas...
- Dona Prasanta, levanta. A Abigail está aí com um cesto.
- Estou lendo.
- Éhhh... Ninguém sabe que a senhora não tem nem ginásio como eu. Os brigadeiro estão pronto. Irra! Tão delicioso.
- Bastiana, pega suas coisas e cai fora. E se abrir o bico já sabe.
- Nossa, a senhora só pode estar brincando. Se me demitir conto pra todo mundo sobre o bebê. Não tenho medo não.
- Abigail me trouxe uns dinossauros. Pra eu cuidar, não me sentir sozinha. Diz que são dóceis.
- De pelúcia ou de brigadeiro? Naquele cesto?
- Digamos que são uns clones.
- Ai!
- Por que gritou? Não é pra ter medo. Mande Abigail entrar.
Abigail entrou no quarto de Prasanta um tanto preocupada.
- Sua empregada talvez seja problema. Esqueci dela. Como ela é sua chegada, um presentinho resolve, não é?
- Chegada é você. Trouxe Beth?
- Sim. Não só Beth mas também seu irmãozinho Mac.
-Óóóóó... São tão bonitinhos! Bastiana, venha ver.
- Ahhhhhhhh...
- Ela está assustada, Abigail. Olha, desmaiou. Veja se não bateu a cabeça.
- Não, não, está tudo bem, Prasanta. Ela vai se acostumar. É só por uns dias.
- Acho que vou deixá-los na cozinha. Eles comem o quê.
- Qualquer tipo de folha.
E mais uma vez a lua raiou. Prasanta preparou-se bem para o forró, enfeitando-se com paetês de cores berrantes. Quanto a Bastiana, essa, depois de uma longa conversa com Abigail, acabou por se entusiasmar pelos rebentos.
- Nossa patroa, que luxo! Isso tudo é da nova era, não é?
- Pare de chorar, Bastiana. Pare! Eu sei como é. A primeira vez que olhei para um bicho desses, não sabia se chorava ou se ria.
- Beth comeu todos brigadeiro. Snif!
- Ponha os animais no quarto de hóspedes.
- O cocô deles é estranho, Madama.
- Bastiana!
E ao som de Chorando se Foi, a noite começava quente. Das baladas nas praias ecoavam cantorias, gente corria nas calçadas... Prasanta saiu rapidamente e dançou a noite inteira no Sarada Rosa. Mas estava insatisfeita. Preferia Bentinho e seus mimos, ainda. Aquela vida não era exatamente o que queria. De súbito, saiu correndo do Sarada Rosa, tropeçou, quebrou o salto e foi aquela gargalhada...
- Bentinho, cadê meu bebê, home?
- Uxi, veio de ônibus é?
- Vim.
- Seu bebê está com a vizinha.
- Bentinho, ninguém pode saber de meu passado, que fui uma sem-teto, que...
- Chega, chega, muié. Já sei. Vai levar o bebê.
- Sim. Bastiana vai cuidar de meu bebê.
Prasanta voltou de ônibus até seu luxuoso apartamento e no percursso
ficou o tempo todo de pé, segurando o bebê, ao lado do motorista.
Seu lenço branco amarrado na cabeça servia como disfarce. Mas
ouvia sussurros meio incômodos...
- Essa tem bebê e pensa que ninguém sabe!
Não, era alucinação. Ninguém a conhecia, ninguém! As pessoas tinham mais o que fazer...A madrugada se foi, Prasanta acalentou seu bebê até a chegada de Bastiana.
- Bom dia, Madama. Essa Beth e esse Mac...Ah, trouxe o bebê, trouxe o bebê?
- Sim, vocês vão cuidar pra mim, não vão?
- Claro, Dona. Com um dinheirinho a mais tudo se resolve.
- Pois leve-o pra sua casa agora. Tire folga hoje.
- Tá bom.
- E me traga Mac e Beth, por obséquio.
Depois de um quarto de hora...
- Pronto, aqui estão. São uns anjinhos, viu! Comeram tudo quanto foi folha. Dê-me então o bebê que vou indo. Desculpa Madama, mas a senhora não gosta muito de seu bebê. O pai da criança, seu Bentinho...
- Cale-se, Bentinho não é o pai da criança. Fui violentada.
- Irra!
Até quando ficaria com Mac e Beth,
não sabia. Estava començando a amá-los. Era a época
de inocência das ternas criaturas...
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