INVISÍVEL SENSAÇÃO
Virgínia Pinto
De uns tempos para cá comecei a observar os casais. É um olhar novo, diferente de tudo o que sempre percebi. A visão está voltada para o poder que se passa a ter e exercer quando se é não apenas um casal, mas uma dupla imbatível.
Entrei atrasada no táxi que uso habitualmente e fui logo perguntando:
- Como vai o senhor, Sr. Antenor?
- Não vou nada bem.
Esta resposta eu nunca tinha ouvido, pois Sr. Antenor está sempre de
bom humor, alegre e de bem com a vida mesmo nos momentos em que as coisas estão
difíceis.
- O que houve?- perguntei.
- A senhora lembra do meu filho Astolfo?
- Claro que me lembro!
- Ele faleceu sábado passado. Tinha cinqüenta anos, estava na fila
do transplante de fígado e não resistiu.
- Meus sentimentos, Sr. Antenor.- Foi o que consegui dizer ao ver tamanha dor.
E continuou, como se falasse sozinho.
- A Cecília minha esposa, está muito mal, depois que fez a cirurgia e teve o derrame, minha vida nunca mais foi a mesma. Sabe de uma coisa? Ela entende tudo o que acontece e quando contei a ela sobre a morte do nosso menino, ela chorou comigo.
Respirei fundo, por que percebi que aquele homem que estava ao meu lado só precisava de uma ouvinte. Fiquei calada e ele continuou.
- Ela era minha companheira, meu braço direito. Atendia aos clientes no telefone, me achava no celular, corria até o ponto pra dar os recados.
Me lembrei do dia dos namorados em que ele ganhou dela o telefone e mostrou-me, resmungando.
- A Cecília que me deu de presente . Disse que preciso ter um para atender melhor aos clientes. Bobagem. Mais um gasto!
No fundo, tinha orgulho do presente e da melhora que traria ao seu trabalho. Hoje tudo é muito diferente. Ele cuida dela e atende a todos sem seu apoio. Perdeu seu braço direito.
Saí do carro desejando-lhe força para levar a vida em frente, ao que ele respondeu:
- Sabe o que mais dói na perda deste filho? É que eu pensava ter a proteção dele na minha velhice.
Senti um aperto no coração. Era pura verdade o que ele dizia e só consegui dizer:
- Mas Deus não nos desampara e o senhor tem a proteção Dele.
Fui embora pensando naquele casal e na força de todos os casais. Já acompanhei casais amigos que se uniram em momentos de dificuldades e ao fim delas estavam mais unidos do que nunca. Conheci outros que ao menor sinal de problemas se separaram, sem deixar sinal de qualquer amizade ou afinidade.
A sabedoria popular diz: "ATRÁS DE UM GRANDE HOMEM HÁ SEMPRE UMA GRANDE MULHER". Não concordo com esta afirmação. Acho que atrás de pessoas que dão certo na vida, existe sempre um companheiro ou companheira, dando apoio, força, carinho e coragem ao longo do sutil caminho que os leva a permear, suportar e desvendar os mistérios da vida.
Ter ou não ter um parceiro ou parceira pode ser o diferencial do viver. Não por necessidade, mas pelo amor e leveza que um simples diálogo do dia a dia pode trazer.
- Alô!
- Bom dia! Tudo bem?
- Tudo ótimo e com você?
- Tudo péssimo. Acordei em cima da hora. Logo cedo a cachorra engoliu
meu brinco predileto, as crianças se atrasaram para a escola, a empregada
me pediu aumento e eu estou aqui há horas, na fila do exame de sangue.
- Calma, querida! Sei que as coisas não estão fáceis para
você, mas não deve levar tão à sério tudo
isto. À noite estarei aí e conversaremos melhor. Fique bem. Respire
fundo. Tudo vai dar certo!
Existem inúmeros testemunhos de amor todos os dias. Entretanto, quando sentimos verdadeiramente que não estamos sozinhos neste mundo, vivenciamos o mais mágico, invisível e imprescindível de todos eles.
Para voltar ao índice, utilize o botão "back" do seu browser.