DO AMOR DE RAPUNZEL
Francisco Pascoal Pinto de Magalhães


"Fui testemunha do amor de Rapunzel", cuspiu o maluco entornando mais um copo de uísque de quinta categoria - gotas do liquido escorreram pela sua barba malcuidada e inundaram a camisa amarfanhada justamente no peito esquelético. Fiquei imaginando de que cor seriam aqueles seus olhos injetados que se escondiam por trás do raiban enquanto lá fora, a tarde desabava sem sutilezas por sobre os velhos edifícios do lado decadente da Augusta. Ah isso é letra de música, pensei. E era. O poeta com os dias contados disposto a tirar o chapéu para quem o desmentisse. Era isso aí.

Concentrado na minha cerveja, não me atrevi a questioná-lo. Observei apenas que o seu ocaso, como o da tarde, desabava.

Dia seguinte viriam manchetes e adoradores de ídolos. Haveria quem se sentisse órfão. E cantariam. E chorariam. E cortariam os pulsos. Ele, se vivo, gargalharia.

Eu apenas fui testemunha solitária da sua perda. Ou pelo menos imaginei sê-lo. O amor próprio e o desamor impróprio dos homens, confinados em torre inacessível, como na história de Rapunzel, era mero devaneio

 

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