INFELIZ
ANIVERSÁRIO
Mairy Sarmanho
Meu cachorro está morto. E estou
presa a esse fato como borboleta em teia de aranha. Não consigo me libertar.
O sentido que aquele cãozinho dava à minha vida me aprisionou.
E fostes tu quem o matou.
Tenho cuidado de cães da rua, trabalhado para salvar alguns, batalhado
para incentivar adoções, espalhado pelo mundo afora o argumento
de "Salvem uma vida. Adotem um cão! Fora cczs. Livrem-nos das carrocinhas!"
Mas, apesar de tudo, existe um momento que paro e percebo que nada irá
trazer de volta aquele ser tão especial que me tirou do abismo, resgatando
minha alma e meu corpo. Deixei-o aos cuidados de minha mãe. Fui traída.
Não por ela, mas por ti! Como te odeio!!!
Todos os dias faço carinho em outros cães.
Todos os dias alimento outros cães.
Todos os dias trato as feridas de outros cães. Mas ninguém trata
as minhas feridas, ou as dele... Porque essas feridas, infelizmente, são
intratáveis. Dizem que o tempo cura tudo. Mentira! O tempo apenas aprofunda
os ferimentos, tornando-os mais negros, mais doentios, mais cruéis! Sangra
por dentro, hemorragia que não mata mas corrompe. E destrói até
o fundo dos ossos. O tempo não me fez esquecer, ao contrário,
apenas mostrou que tua crueldade não tem limites e não existe
perdão para ti. Nunca vai haver!
Tomara, do fundo de minha alma, tomara que sofras tanto quanto eu e ele sofremos.
Tomara que te arranquem os olhos de tanta dor, que te aniquilem os sentidos,
te maltratem, te açoitem, te roam os ossos, apodreçam a carne.
Tomara que tudo de mal te aconteça! E não penses que tenho medo
de rogar praga porque bem o sei: é praga justa, carrasca, dolorida. Quero
que pagues milímetro por milímetro a dor de todos. Em todos os
casos. Todos!
Estou presa pelo mal que fizestes. E só teu fim me libertará!
Tenha grandes dores! Seja infeliz! E, para melhor aproveitares tudo isso, tomara
que viva muitos, longos e deprimentes anos! Infeliz aniversário e muitos
anos de vida!
Para voltar ao índice, utilize o botão "back" do seu browser.