HISTÓRIA REAL,
NOMES FICTÍCIOS
Regina de Souza
Nervoso, pela primeira vez ele tocou a campainha do apartamento do vigésimo andar. Nunca havia imaginado que o interior do edifício onde morava sua namorada pudesse ser tão luxuoso. Dava até para sentir algum incomodo, já que sua família era de classe média.
Algumas horas antes ele havia começado a se preparar visual e emocionalmente para a visita, afinal a moça valia a pena. Estavam apaixonados os dois. Os pais dela já sabiam que a coisa estava ficando séria e, após inúmeras considerações importantes sobre as conseqüências do encontro com o moço, concordaram com a filha única e marcaram a data.
Uma jovem e elegante senhora abriu a porta, apresentando-se como mãe da amada do jovem protagonista desta crônica.
- Como vai, Felipe? É um prazer conhecer a pessoa mais citada por minha filha nos últimos meses -disse ela, com um sorriso simpático e alvo como o da filha.
- Prazer igual ao meu, D. Stella! Espero que me desculpe por ter chegado alguns minutos antes da hora, mas quem mora em São Paulo sabe como é difícil estacionar o carro nestas ruas e, apenas por isso subi antes.
- Não se preocupe, Felipe. Estamos praticamente prontos. Vou pedir à Flora que lhe sirva um café ou um suco. Aceita?
- Aceitarei um café, obrigado -respondeu ele, pensando na possibilidade de fumar um cigarro que lhe ajudaria a abrandar os nervos durante a espera.
- Sente-se e fique à vontade, por favor.
- Obrigado, Senhora.
Nada de cinzeiro no apartamento maravilhoso. Um calafrio o fez temer ao bater os olhos num Di Cavalcanti legítimo dependurado sobre a rica lareira. Se trabalhasse ininterruptamente durante uma década, provavelmente sua renda seria suficiente apenas para emoldurar uma tela daquelas. Problemas á frente, pensou ele.
- Boa tarde, Sr. Felipe! Sirva-se, por favor! -disse uma jovem vestida com um uniforme impecável de copeira, estendendo-lhe uma bandeja de prata com o café e um cinzeiro também de prata, da qual ele retirou a xícara com elegância.
- Vou abrir a porta da varanda para que o senhor fume seu cigarro tranqüilamente depois do café. Sua namorada me pediu isso, antes que o Sr. chegasse! -diz Flora.
- Muito obrigado! -disse o rapaz, antes da moça se retirar e sentindo-se bem mais à vontade.
Sentou-se e quando ia provar o café, foi surpreendido por um Pinscher de mais ou menos uns 5 meses, que era -segundo declaração da proprietária de seu coração- o segundo amor de sua amada.
- Olá, menino! Claro! Você só pode ser o famoso Fefê! Sabia que seu nome é o diminutivo do meu?- disse Felipe, tentando sem sucesso afagar a cabeça do pequenino e agitado Pincher que saiu em disparada, retirando-se da enorme sala e voltando logo em seguida com uma bolinha azul presa entre os dentes e oferecendo-a ao novo amigo.
Sorrindo, o rapaz aceitou a oferta e na falta do que fazer, iniciou uma brincadeira divertida com o cão. Sagaz, Felipe tentava enganar o cãozinho com lançamentos imaginários, daqueles que induzem o olhar do outro a falsos arremessos. O esperto Fefê logo percebeu a estratégia e parou estático sobre o tapete persa.
Felipe ameaçou várias vezes arremessar a bolinha a um Fefê imóvel, com uma das patas dianteiras suspensa, em estado de prontidão para correr atrás da bola assim que ela rolasse livre pelo solo. Felipe bateu a bolinha no centro do tapete, admirado com a velocidade do cãozinho ao sair em disparada na direção da bola.
A partir daí, a cena ficou gravada para sempre em sua mente, como num filme mudo rodado em câmera lenta: ...Fefê galopando ...alto ...a cada batida ...da bola no chão...a bolinha azul indo ...a varanda ...o vão da grade ...o mergulho do pequenino corpo ...no espaço enorme ...a vontade inútil de querer parar o tempo ...Fefê indo...
- Meu amor, que palidez é essa? -...a namorada.
- -...ele.
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