LUA CHEIA
Rita Alves
Estou
conhecendo o inferno da dúvida. Deixo esta carta pra você e não me interprete
mal, não pense que fiz isso de caso pensado. Tomei a liberdade de roubar-lhe o coração
pra depois colocar na lata do lixo através dessas linhas, mas não há maldade
nisso. Há apenas o contentamento em meus olhos de saber que todas as certezas
são inúteis. Acho que tudo não passou de uma paixão que me destruía o bom
senso. Quando você ler esta carta eu já estarei longe, e sei também que será
lua cheia e ela é minha cúmplice. Nesta fase ela ilumina mais os caminhos, é
por isso que a escolhi para ajudá-la a ler esta carta, porque mesmo que seus
olhos encham de lágrimas ainda haverá bastante luz pra que você consiga
caminhar de volta para casa. Ela também já foi ouvinte dos seus gemidos e já viu com quanta paixão eu a beijava. A luz da lua refletida
no seu corpo a deixava ainda mais bonita e ela parecia saber disso, surgia de
repente, a nuvem dava passagem, como magia. A paixão ainda arde, minha querida,
mas eu me proíbo. A minha fome de viver se fez maior que minha paixão! Deixo a
nossa história plantada no jardim que você cuidou com carinho. Tenho fome e
quero me fartar das belezas da terra, quero andar sem destino, quero me
encontrar na simplicidade das coisas, quero ser livre como a lua que muda de
fases. Estou minguando longe de você, já posso sentir isso, mas o amor por mim
mesmo cresce e vou me tornando o novo que sempre procurei e quando estiver
suficientemente cheio de amor, talvez eu volte pra você. Mas não preencha o seu
coração de expectativa, esvazie seus pulmões e grite aos quatro cantos a sua
dor, mas não permita que o conforto da esperança tome conta. Eu posso desistir,
posso me perder no caminho porque a mesma lua que iluminou nossa paixão, ilumina tantas outras. Outras histórias, outras vidas...
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