PESCANDO SEREIAS
Alberto Carmo
Ah, a lua! O
que seria de nós neste planeta molhado sem essa musa a agitar nossas almas?
Talvez não passaríamos de ETs, de seres verde musgo,
de fungos habitando uma terra sem romance, fria como Urano.
Claro que falo daquela
lua antes da invasão da coca-cola por lá; falo daquele satélite dos tempos em
que Gagarin descobriu o azul-piscina da nossa casa, não da base interplanetária
de humanóides assexuados equipados com estilingues a laser a encher a cara de
biritas em pó.
Como pescador,
e mentiroso, que sou, ergo loas às fases - eu diria TPMs
- dessa nossa guardiã celeste. Como poderia fisgar meus lambaris e tilápias sem
ajuda da lambida carinhosa que ela dá nas águas dia e noite em suaves marolas?
Nem nas horas mais cruéis, quando abandonado por ela fico a dar banho nas
minhocas à espera da beliscada redentora, nem assim consigo deixar de amá-la,
essa ninfa refletida no vai-e-vem das praias.
Essa bolota
desabitada que menstrua toda semana, e nos brinda com páginas prateadas de um
livro delator das fases e humores do ser mais fascinante que vive em nossas
plagas - a mulher.
Não é a Lua uma
mulher desnuda a nos tentar os sentidos com seus quadris curvilíneos e
sensuais? Que homem, na mais insana das horas, não busca naqueles mares de
tranqüilidade um pouso para os devaneios e angústias de estar sozinho num
paraíso de voluptuosas cores e indescritíveis sabores dos beijos de uma mulher?
Lua é fêmea no cio, é a tentação das águas femininas que queremos sorver,
sedentos de amor e paixão.
Quando, capitães de nossas caravelas, ousamos singrar oceanos na
mira de estrelas, buscamos o silvo que mais nos enfeitice, seguindo seu rastro
argentino a indicar os mais cobiçados horizontes. E ela, dama generosa dos
nossos ímpetos, cuida que nossa sina de amantes se cumpra ao capricho dos
deuses.
E nos ensina,
essa corista cósmica, a entender a alma feminina em suas danças sinuosas ao
redor de nosso pensamento. Se nos quer aos seus pés, tortura-nos com um sorriso
minguante a sugerir lábios de prazeres que nos clamam a liberdade dos beijos
mais ferventes. E ao cismar em nos enternecer de carinho, veste-se, essa
cortesã das galáxias, em finos véus transparentes a lhe cobrir o rosto de
belezas, e nos mostra um olhar incompleto, cheio de dúvidas
a insinuar tesouros escondidos no fino crescente dos seus segredos.
E depois de
amar-nos à exaustão, brinda-nos o orgulho de guerreiros com a visão da mulher
plena, cheia de luz, fecundada por nossos desejos. Mais tarde, quando já cansados, desgastados pelas guerras da estupidez humana, surge-nos
como mulher nova, exuberante nos traços que a vida lhe deu por presentes e
prêmios, e vem-nos acalentar os sonhos esquecidos, essa deusa de guizos eternos
que dança e gira, e nos atrai ao ímã de suas formas.
Mas aí daquele
que a tente magoar, que a faça perder o viço dos olhos e o frescor dos seios de
menina, porque haverá de enlouquecer, esse traidor, no pior dos tormentos,
quando enciumado a verá desaparecer num eclipse, que a esconderá eternamente
atrás da cortina dos deuses.
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