CIUMEIRA
Lena Chagas
Tarde ensolarada, céu azul e temperatura amena, flores explodindo em cores, árvores cheias de folhas novas e brilhantes em vários tons de verde, fazem do dia um convite. Não dá para desperdiçá-lo trancada entre quatro paredes. Perfeito para andar na rua, sentar na grama do parque para ler, pensar ou não pensar em nada, namorar ou não, jogar conversa fora ou simplesmente olhar em volta e desfrutar.
Corto caminho pela rua mais arborizada e em quinze ou vinte minutos de caminhada, já estou à procura de um metro quadrado de grama limpa para buscar assento. Impossível. Depois de percorrer o parque inteiro, descobri que o privilégio de usar a grama estava em outras mãos, quero dizer, em quatro patas. Desisto.
Um banco, quem sabe? É o jeito. Vazio, difícil! Dá licença? Finalmente! Escorrego no assento procurando uma posição cômoda, relaxo o corpo e a natureza me abraça. Cercada de verde por todos os lados e um azul intraduzível no topo. 'Irretocável!' - penso quase em voz alta - Tudo se encaixa, tudo funciona. Beleza absoluta. Ar, sol, céu, vento, dia, noite, plantas, bichos... Que papel, afinal, tem o homem, nesse contexto? Quando não destrói, altera a ordem das coisas ou não contribui com nada ou raramente é cooperativo com a natureza... Somos, mesmo, necessários?
Ainda à procura de resposta, minha divagação é quebrada.
- ... Disso eu não abro mão! Não vou mais me sujeitar a essa situação! A que ponto nós chegamos? Eu dormindo no sofá da sala e ele na cama, com você? Isso é o cúmulo! Pra mim, chega! Ou eu ou ele!
A discussão parecia durar algum tempo. Continuei na posição em que estava, de frente para o lago e de costas para a raiva e o tom de voz que só cresciam entre aquele casal.
- Você é quem sabe! Podíamos ficar juntos, os três, mas você implica!
- Implico, eu? E há quanto tempo você não me chama de amorzinho?
- Mas eu não posso chamar vocês dois pelo mesmo apelido, não é?
- E quem chegou primeiro?
- Detalhe!
- E quem acordava você com um beijo na boca e levava o seu café na cama?
- Só faltava ele me servir café! Não seria o máximo? (gargalhada interrompida): Espera! Aonde você vai?
Não resisto e me viro para ver a cena, quando ele, se afastando, diz a última frase:
-Já percebi quem você escolheu!
Ela, com um cãozinho no colo que lambia o seu baton, diz com a voz macia, sussurrando, quase lhe retribuindo a lambida:
- Você viu, amorzinho? Ele morre de ciúme de você!
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