RODAPÉ DO IMAGINÁRIO
Ana Terra

O imaginário numa noite gelada. Tão fria que uma fogueira fez-se necessária. Galhos secos e tenros para os estalidos. Música na madrugada.

Uma presença macia se aproxima. A escuridão e as chamas tremulantes me impedem de ver seu rosto. A luz do fogo é tão clara que ofusca. O vento não colabora. Movimenta as chamas para todos os lados.

Sentada no chão, a presença me olha. Sinto. O fogo reflete em meus olhos, cegando-me. Mãos no colo. Pequenas. 

A lua aparece. Agradeço. Esperança de luz. Que ilusão! O contraste do branco e do vermelho amarelado faz da cena algo invisível.

Obstáculos. Que me dão forças para desafiar o imaginário. O vento tenta levar a única coisa visível: um cachecol colorido. Mas não consegue. Está preso no pescoço da minha imaginação.

As chamas crescem. Nada posso fazer. Chamo pela espera, que chega camuflada.

Não há freios. Como fumaça mãos se tocam. Corpos se aproximam. Cheiro de cio. Imã. Movimentos sensuais no ar. Desejo que arde. Explode. Nada se vê. Sente-se.

E o fogo ali, no ritual da purificação.

A lucidez me impede de alimentar a fogueira. A razão me mostra que os galhos se transformam em pequenas brasas. Luz que não ilumina. Apenas aquece.

Parece-me que o imaginário se tornará real. Receio e curiosidade. Fecho os olhos. Sinto o vento gelado acariciar meus cabelos. Meu corpo esfria. Sintoma que a presença parte. Com toda a sua maciez e delicadeza.

Prolongo o momento de abrir os olhos, até sentir a ausência de calor. Com coragem entreabro as pálpebras e vejo a presença macia partindo com a fumaça.

Que farei com estas brasas? Esperar que elas sejam cinzas? Não. Vou submetê-las a um esfriamento rápido. Água. Que escorrerá e levará os resíduos de um momento de alucinação.

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