PARABÉNS PARA QUEM?
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No ano em que nasci, a música da parada era I Will Survive, de Gloria Gaynor. Diga-se de passagem, hoje o hit virou marca registrada dos gays. Apocalipse Now era um dos filmes mais assistidos. Uma menção de Francis Ford Coppola à devastadora guerra do Vietnã. Universo paranóico da guerra. Foi em 1979. Ano do filme, não da guerra. Ano em que nasci. I Will Survive e Apocalipse Now, qualquer semelhança é mera coincidência. Talvez os soldados da guerra esperassem sobreviver. Deve estar aí a mera coincidência. Sei que as pessoas iam ao cinema assistir Apocalipse Now, e depois para a boate dançar ao som de Gloria Gaynor. Era Jimmy Carter o presidente dos EUA. Mas foi Nixon o senhor da guerra. Colocou vietcongs e norte-americanos frente a frente no campo de batalha. No Brasil, era tempo de anistia, concedida por João Baptista Figueiredo. E nas rádios, O Bêbado e O Equilibrista, cantada na perene voz chamada Elis Regina.
Na década de 90 nasceu minha irmã, filha caçula e última de três mulheres. Foi quando eclodiu a Guerra do Golfo. Não era mais nos livros de história que aprendia. Via na TV Saddam Hussein, o mesmo, e George Bush, o pai. A guerra do petróleo. Não seria a última. E eu com 10, 11 anos. Brincava de Barbie e assistia na TV os clarões da bomba. Pareciam bombas festivas de Ano Novo. Que gostoso o Ano Novo, vida nova, promessa de renovação. Mas não era nada disso. Me dei conta quando vi as primeiras mortes e as sombrancelhas tensas na cara dos correspondentes. O filme da década foi Silêncio dos Inocentes, umas das obras primas de Anthony Hopkins. Outra mera coincidência? A música era o Papa é Pop, dos Engenheiros do Hawai. Época de transição entre José Sarney e Fernando Collor de Mello. Só um Papa muito pop resistiria a um mundo tão esquizofrênico. Eu era criança, mas já adorava história. Devorava as livros didáticos e sofri uma meia dúzia de paixões platônicas por diferentes professores da matéria. Me lembro de uma noite em que tive um pesadelo com Nostradamus. No meu sonho o profeta estava certo: depois de Napoleão Bonaparte e Adolf Hitler, o terceiro anticristo que viria devastar a humanidade seria Saddam Hussein. Naquela noite acordei chorando. Era um misto de pavor da guerra e medo de não ter a minha prometida festa de aniversário, dali a uma semana. E se o mundo acabasse? Só acabou a União Soviética.
O resto continuou. Estamos no século XXI e nasceu mais uma geração da família, minha sobrinha. O Papa é o mesmo, Karol Wojtyla, e apesar de velho e cansado, continua sendo o mais pop da história, 25 anos ininterruptos de Igreja Católica. A guerra é a mesma, quase com os mesmos nomes: Saddam, o próprio, versus Bush, o filho. Guerra do petróleo, de novo. O homem da vez no Brasil é o Lula, um torneiro mecânico que virou presidente da República. Como prometido, tive a minha festa de aniversário de 12 anos. Mas não me lembro muito dela. O que ficou na memória foi o pesadelo com Nostradamus. Depois dos 15 virei pacifista. Não tolero mais guerra. Mas ainda gosto de história e de festas de aniversário. Só que estou pensando se vou comemorar esse ano. É que a música da moda não me agrada, é a tal da Eguinha Pocotó. Napoleão Bonaparte foi parar no Museu da Faap, aqui em São Paulo, e Saddam Hussein está desaparecido. O filme nacional é Cidade de Deus. Bom, mas triste, porque também fala de guerra, de apocalipse, do silêncio dos inocentes, de tudo o mais sobre injustiça, pobreza e morte.
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