A
METAMORFOSE
Lena Chagas
Nenhum outro livro que eu tenha lido na adolescência foi tão marcante. Diria até avassalador, visceral. A memória e as sensações não me deixam mentir e permanecem bem vivas mesmo depois de tanto tempo.
Lembro do calor úmido de janeiro, do ônibus sempre lotado no horário do meio-dia, a caminho do trabalho. Era uma mistura de asco, aflição, humor e curiosidade que me dominavam sem qualquer alternativa. Impossível parar de ler.
A história insólita daquele homem que amanhece metamorfoseado num inseto que se agiganta a cada dia, prendia pela riqueza de detalhes, pelo humor sutil e pela ironia sarcástica, tão peculiares ao estilo de Kafka. Mas o ingrediente principal era a metáfora. Era perceber o significado daquela transformação.
O momento não podia ser mais propício. Primeiro emprego, regras rígidas, chefes autoritários, controles insanos e inaceitáveis. Sentia-me o próprio Gregor Samsa dentro de um monstruoso inseto, oprimido e obrigado a se submeter às cruéis engrenagens sociais.
Não morri, como morreu o herói da história, mas com certeza, muito de mim deixou de viver por não me ter libertado.
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