A
PRACINHA
Heringer
O campanário majestoso
Da Matriz do Bom Jesus
Na mineira Manhumirim
É testemunha do fato
De fato, seu velho amigo
Viu com olhar triste e sério
O ocaso desta pracinha
Ela, fiel, dedicada
Era-lhe como um filha
Se espraiava às suas faldas
À sombra das suas torres
Era amada, mui querida
Decerto que a viu sorrir
Por certo que a viu sofrer
Estranho destino este
Das praças interioranas
Embelezadas, vestidas
Enriquecidas assim
Sucumbem na própria pompa
Esvaem-se em solidão
E o campanário chorou
Pois que muito se esforçou
Pra desmentir esta sina
De tudo tentou em vão
Badalou seus grandes sinos
Gritou bem alto aos meninos
Cantou as missas mais belas
Inútil!
A pracinha adoeceu
Enfermou-se e feneceu
Transmudou-se em adereço
Mas, em sua mocidade
Plena de simplicidade
Fora a mais feliz das praças
E o campanário recorda
Lembrando os dias passados
Como ela ria ao seu lado
Feliz e esbanjando graça
Seus enfeites eram parcos
Naturais, até singelos
Arvorezinhas copadas
De exótica geometria
Que podadas por inteiro
Por obscuros artistas
Posavam surrealistas
Seu chão era terra batida
Onde os nossos pés ligeiros
Faziam mil diabruras
Bolas de gude e de couro
Bicicletas, travessuras
E a nossa grande alegria
Era por certo a razão
Do seu imenso sorriso
Então a pracinha exultava
Enaltecida, feliz
Atulhada de fedelhos
Mas se os olhos nos ardiam
Quando ali um lacerdinha
Instalava-se atrevido
- E como ardiam os olhos!
Ela chorava conosco
Sofria por seus amigos
Um dia, um triste dia
Desses dias aziagos
Que o modernismo inspira
A novel engenharia
Vestiu-na de ricas rendas
À moda metropolita
E a molecada aflita
Nela não reconheceu a amiga
E deixaram-na sozinha
Entre soluços e dores
E ainda assim, hoje está
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