RECORDAÇÕES
DE SEMÁFOROS E DESAFOROS
Beto
Muniz
Não lembro
mais o rosto da minha primeira namorada, mas acho que ela era bonita.
Sabe essas pessoas que jamais serão esquecidas? Vão fazer parte de nossas
recordações por mais que o tempo passe e as lembranças se definhem? Ela
será eterna em minha memória... Apesar de, daquela época, lembrar apenas
que éramos crentes e virgens. Não lembro sequer seu nome, porém ela existiu.
Foi a primeira namorada, de primeiro beijo, primeiro passeio de mãos dadas,
primeiro cinema, primeiro beijo na nuca, primeiro passar de mãos nos seios,
primeiro sarro entre as coxas, primeira ereção sentida por mão que não
a minha direita. E por serem tantas as primeiras experiências a dois é
que ela será eterna em minha memória. Foi a primeira em quase tudo, inclusive
combinando a primeira noite. A primeira transa. O primeiro gozo. Tudo
arranjado, desejos contidos, guardados para a ocasião! Banho, perfume,
esmero e o encontro atrás da igreja. O culto iniciava quando nos perdemos
das vistas severas. Na garagem de casa a Kombi estacionada. Sinal verde!
Todos no culto: meu pai pastor e o sogro presbítero. Glória a Deus nas
alturas, que castiga tudo que há de pecado aqui na Terra! No banco traseiro
iríamos até o final se as regras da menina não se manifestassem. Sinal
vermelho, dizia a mancha na lingerie. Até compreender o que acontecia
eu fiquei ali, teso, incrédulo, um pé na calçada e outro na faixa de pedestres,
louco pra chutar pneus. Então se fez luz em minha mente. Depois escureceu
novamente. Lembro da raiva, da ansiedade, da respiração pesada e principalmente
de tentar achar uma solução pra completar o trajeto, cruzar aquela avenida.
Certamente que não atravessei no vermelho! Aliás, como não encontrei solução,
mandei o semáforo inteiro às favas e fui orar. Continuei crente e virgem
por um bom tempo, pois a sinaleira jamais me perdoou a grosseria... Isso
eu tinha esquecido!
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