VAI DAR DE VADIO,
VALDO?
Edison Veiga Junior
Não me lembro direito se era Valdo porque Valdomiro ou Valdonier. Na verdade nunca soube e creio que sequer ele mesmo sabia. Talvez ainda fosse corruptela malfeita de Vladimir, Valdir, Valdeci. Não importa. Tenho certeza que você não quer saber essas coisas, como também não quer saber onde nem quando nasceu Valdo, se tem filhos, se tem todos os dentes na boca, se tem câncer. O que? Quer saber? Danou-se porque não estou a fim de contar.
O que vou contar, e você será obrigado a saber ainda que contra a sua vontade, é que Valdo tinha um vício. Sua heroína se chamava Vanessa ou Verônica ou Valéria ou Valquíria ou Vanda ou Verusca... Vera não, estou certo disso. Seria Virgínia? Hmmm, sou péssimo para nomes, você sabe. Mas voltemos ao Valdo: ele curtia deveras dar uma voltinha com seu vício num velho Voyage vermelho que era seu orgulho.
Volta e meia, nas horas vagas, o violão vociferava:
- Você é linda, mais que demais...
Para a vizinha, aquilo era um vodu. Ela, víbora, reclamava:
- Vá praquele lugar, seu viado filho da mãe. Vou te mostrar pra onde mando os vigaristas vagabundos! Essa algazarra até hora desta? Eu quero dormir! Sua casa vive infestada de malandros! Vou chamar a polícia.
Vez ou outra Valdo cismava de vigiar a Lua. E viajava gostoso vigiando a rechonchuda concubina de São Jorge: armava planos com as estrelas, convencia cometas, enxergava até a não-luz dos buracos negros, tudo para que a Lua não se aproveitasse da distração dos terrestres lunáticos e de repente fugisse pra órbita de outro planeta.
Às vezes, ao invés de fazer nada, cheirava Vinícius enquanto lia poesia. Depois desandava a vomitar versos por uma ou duas semanas. Vibrava ouvindo Velhas Virgens numa vitrola moderninha que tocava até CD com MP3. Valdo sorria, mas só de vez em quando.
Vazio por dentro e por fora, Valdo era um zero à esquerda. Vazio e vadio. Seu nome não rimava com trabalho e seu maior orgulho era não precisar comer o pão ganho com seu próprio suor, que nojeira!, ah! isso sim é que era motivo para se orgulhar. Quando alguém lhe dizia, cínico:
- Vai dar de vadio, Valdo?
Vitorioso ele simplesmente sorria sozinho. E voltava a assoviar, desviando da vassoura que há muito pedia emprego em sua casa.
Vaidade? Valdo usava Gumex no cabelo.
Vaidade? Não trabalhar, andar no seu velho Voyage vemelho com alguma mulher que começasse por v.
Vaidade? Você não está entendendo? Vaidade é este negócio de brincar de Deus, criar um personagem de nome Valdo e escrever várias linhas vazias sobre ele. Vaidade é criar sem mas nem porquê.
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