Percival era
um típico solteirão de meia idade. Adorava sair com as mulheres compromissadas
ou não. Na verdade, ele preferia as casadas. Gostava de se reunir com
os amigos, almoçar fora, ir ao clube, assistir futebol ou filmes na TV,
tudo isso é claro, desde que acompanhado de uma cervejinha gelada. Novela
ele não via, ele jurava pela alma de sua mãezinha, dizem as más línguas
que só assistia escondido atrás da cortina.
Fazia sua caminhada diária de uma hora e alguns exercícios físicos que
sempre mantinham seu corpo esbelto. Porém o tempo foi fazendo jus a fama,
ou seja, realizou aquele efeito estético não desejado. Somando-se a tudo
isso, a preguiça começou a tomar conta de sua vida.
A caminhada passou a ser dia sim, dia não. Os exercícios foram reduzidos
gradativamente até serem totalmente abolidos e quando se deu conta, já
não era mais aquele. Não deu muita importância a tudo isso, pois sempre
tinha uma namorada para sair e um chopinho rotineiro para ocupar os dias
vagos, fazendo do seu dia-a-dia um cotidiano prazeroso.
Com o passar dos anos, Percival foi sofrendo o desgaste daquela vida sedentária.
Há um mês, quase dois, ninguém sabe ao certo, ele não aparece mais ao
chope semanal, nem no clube. Algumas moçoilas até reclamariam conosco
a sua ausência, não fosse a total discrição do "Perci".
Pergunto por ele às pessoas mais chegadas e nada... Ninguém sabe do seu
paradeiro. Foi exatamente nessa hora que começamos a nos preocupar com
nosso velho amigo. Será que havia partido dessa para uma melhor? Espero
sinceramente que não, a tal figura era muito querida por todos nós.
Numa bela sexta-feira de sol, fim de tarde no Leblon, eis que surge o
Percival. Rosto empinado como de praxe, corpo esbelto e bem definido como
há muito não víamos e um sorriso nos lábios. Não era uma expressão de
felicidade, tinha novamente aquele seu jeitão superior e vaidoso.
Olhamos para ele e perguntamos sobre o ocorrido. "Perci" sorriu meio sem
graça e nos contou tudo. Disse-nos que apesar de ser de classe média,
ou seja não possuir grandes riquezas, gastou todas as suas economias.
Vendeu seus bens e fez várias cirurgias estéticas, aliadas a um mês de
sofrimento num SPA caríssimo e não menos famoso.
- Mas, "Perci"? Logo você que era um pão-duro, que não abria as mãos nem
pra jogar peteca? O que deu em você, amigão?
- Bom, primeiro foi num belo dia quando passeava pelo calçadão de Copacabana
e uma menina de rua me interpelou colocando a palma da mão em minha barriguinha
de chope: - Tio, o senhor tá grávido?
- Quê isso, "Perci"? Você tá brincando, né?
- Vocês nem imaginam, o pior ainda estava por vir. Vocês sabem que eu
não costumo pegar ônibus, né?
- Sei, amigão. E o que tem o transporte coletivo a ver com o seu problema
estético?
- Sabe como é, né? Num dia quando o meu carro estava fazendo revisão no
mecânico, fui obrigado então a encarar o lotação.
- E aí? Conta mais...
- Pois é, nesse dia ao descer do tal veículo gritaram aquelas palavras
que foram definitivas nessa minha decisão final.
- O que foi, alguém te xingou?
- Não, pior!
- Já sei, xingaram sua santa mãe?
- Pior, muito pior! Desferiram aquelas duas palavras que me jogaram na
sarjeta!
- Te chamaram de gordo de novo?
- Não, alguém bradou em tão alto e bom som que todo pessoal do ônibus
parou e olhou pra mim.
- Gritou o quê, "Perci"?
- Vaiiii, Idoso!
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