ELA DISSE QUE O AMAVA
Adriana Vieira Bastos

Mas ele continuava sem acreditar. Ela nunca tinha tempo para ele: ora tinha que levar a mãe ao cinema, ora encontrar a amiga que não via há anos. Ela ia, ia e ele triste ficava.

E o almoço de domingo com a família? Desculpe, dizia ela, mas esse compromisso era sagrado, afinal, família é uma só.

Com o passar do tempo, começou a se encher, pois queria sentir-se especial na vida dela. Reclamou, brigou, implorou e escutou como resposta que sua possessividade impedia-o de perceber o seu amor. Ela ia, mas nele sempre pensava, não entendia o por que de sua bravura. 

Confuso, aceitou fazer terapia. Não a entendia, quem sabe Freud explicaria?...

Terapia vai, terapia vem, achou estranho o papo de não ser bom jogar suas expectativas no outro. Papo intelectual ou não, estaria aí o fio da meada de sua vida? Cutucaram sua ferida!

Expectativa pra lá, expectativa pra cá, resolveu também terapeutizar e perguntou-lhe por que só conseguia dizer não a ele. Ah! Mas com ele sentia-se à vontade para ser ela de verdade. Bonito, não?

Não, não era nada bonito! Não era bonito ser rejeitado na maior, como se isso fosse natural. Então resolveu prestar atenção no que a psicóloga falava.

Aliás, a psicóloga quase nada falava. Ele, sim, se enfezava, esperneava, xingava, enquanto ela olhava, absorta em seus próprios pensamentos e, vez em quando, dizia com aquele ar irritantemente superior: "- tudo é uma questão de expectativa".

Resolveu, então, partir para livros de auto-ajuda. Livro vai, livro vem, finalmente descobre o segredo capaz de mudar o curso de sua vida: ele próprio.

Começou a fase de auto-exploração: um dia passou perto do espelho, timidamente olhou, ficou ruborizado, mas não abriu mão de ir até o fim e encarou. E não é que se encantou! Avistou, do outro lado do espelho, um cara simpático e bom papo. Uma gracinha. Sentiu rolar um "climinha"! 

Carente, resolveu investir nesta nova relação. Tanto investiu que, num ato de loucura, não resistiu e resolveu o quarto todo espelhar. Não conseguia mais sem a companhia do rapaz do espelho ficar. 

E o rapaz do outro lado do espelho correspondeu tanto às suas expectativas que, no dia em que escutou não ser mais importante na vida dela não doeu, pois ela também já não fazia parte de sua vida. 

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