BLUE
Reinaldo de Morais Filho
Ana vestiu a saia azul, com os olhos tristes, com as pernas lindas do lado de fora. Detestava mostrar o corpo assim de graça, mas não se permitia discordar do marido, e ele queria a saia azul naquela tarde.
E vestida de bela, deixou as calçadas e andou na rua, como se fosse livre. Mas já estava casada. Saltou sobre os hidrantes, como se fosse criança. Mas já era mãe. Ao fim, entrou no restaurante, como se não tivesse escolhas.
Ana era um típico caso de mãe-adolescente-abandonada-pelos-pais. E desde então, pensa que a sua última escolha pode ter sido não aceitar o aborto, casar com o namorado, esquecer a família.
O marido já estava na mesa, sentado como um velho, jornal na mão, tomando um vinho - embora fosse um moço indeciso. Atraía olhares das moças tolas, como se fosse um elegante rapaz - e ela o enxergava um
sedentário sujeito sem graça.
Olhou para a rua, como se esperasse a chuva. Mas o seu mundo era todo previsível. Pensou em lutar, como se lhe sobrasse bravura. Mas desculpou-se da covardia com a lembrança da filha pequena a criar.
Recebeu o beijo do marido e o cumprimentou. Apagou a vela de um ano de casamento com um sopro forte, como se estivesse a comemorar. E era apenas um suspiro de dor.
Sentou na mesa com um sorriso nos lábios, como se fosse feliz. Mas era a mais triste jovem no lugar.
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