HERA
Rosi Luna
Hera. (do lat. hedera) S.f. Designação comum a diversas plantas trepadeiras da família das aralíceas, especialmente a Hedera helix [Pl: heras. Cf era, eras, do v. ser e erar, e s.f.].
A planta rastejante se arrasta como praga como entrava aos anseios e devaneios do homem na sua busca pelo entendimento do mundo. O homem se desumanizando perdendo a ternura virando planta, virando bicho, virando vácuo herméticamente fechado às relações de ternura. Onde foi parar a palavra candura? Sem vida de luz e clareza. Fotossíntese planetária. Largando a indumentária. Despido de propósitos. Um homem sem depósitos. Uma vida vazia. E nessa vastidão algoz das hastes da planta se espalhando aparentemente frágeis formam uma cadeia.
Tem horas que me sinto planta, uma hera esparramada. Tem horas que sou apenas uma pessoa querendo ser amada. Minhas folhas verdes também são folhas de palavras. Tem dias que sou folha seca, me sinto ocre, sem vida, triste. Tem dias que tenho
viço verdejante, minhas folhas são escritas palpitantes. Estou lá no muro onde estão todas as minhas dúvidas. Cada dia podo as atitudes que não tenho coragem de revelar. Sou apenas adubo da minha criação.
Não me tolhas, deixe minhas folhas. Sou hera mas também sou geração, sou era de áquario. Sei que tem dias que pareço presa no armário. Me deixe planta ou ostra. Me fecho - ostracismo. Sei o que é uma ostra cismada. Sou eu que não entendo
nada e quero ser reveladora. Não sou filme, não tenho fotogramas. Só dramas corriqueiros. Meu jeito de maneirismos ligeiros. Vamos, ande gatuna, roube a ampulheta. Não me fale de rugas e nem de nesgas do tempo. Vamos, me fale de vespas e de tartarugas andando devagar. Vamos divagar. Não quero pensar em nada planejado. Vamos viver o inesperado.
Me deixe ser flor - um lírio. Seu delírio. Vamos, lave os olhos, sou seu colírio. Não me vês. Por mais que me mostres. Ainda que não te entendas. Sei que um dia, virando planta trepadeira subo em ti com minhas ramas. Conclamas minha seiva.
Saiba de minha rendição, sei que és minha perdição. Me sinto algemada em tua mente. E naquela torre cerebral sou tua presa. Ando pra lá e pra cá como bicho de zoológico. Nada é lógico.
Me mostras tantos caminhos, tantos livros. Sou alfinete do teu crivo. Porque queres que eu saiba de artes e bacamartes. Porque me preparas tanto. Te sinto preocupado com minha sabedoria. Basta dizer que quero ser apenas alegoria.
Não me fale em maestria. Vamos, me leve numa confraria, encha meu copo de vinho e fique assim em desalinho.
Até quando suportarei não ver o que tem do outro lado do muro? Que tijolos tão fortes nos separam. Não quero um cimento sem sentimentos. Não me deixe perder a poesia. Não quero fazer analogias. Meu corpo é saudável - nunca tive uma nevralgia. Só sinto nostalgia. Não me deixe viver de lembranças. Vamos
correr como crianças. Pegue na minha mão e vamos plantar um limão. Não quero uma vida azeda.Vamos plantar cana-de-açúcar. Vamos adoçar nossas vidas. Vamos tomar um café. Vamos, acredite e assine em baixo. Dou fé.
As plantas trepadeiras crescem em qualquer direção onde encontrem algo a que possam se agarrar. Por serem rastejantes parecem ter muita humildade e se curvam à vitalidade da essência. Clara evidência de relacionamento. Curvas e folhas, um escorregar amoroso.Tapete frondoso.
Clave de sol. Pega o anzol. Vamos pescar. Me deixe um dia ser peixe e mergulhar em ti. Assim no fundo do mar me deixe te amar por sete ondas apenas. Depois viro sereia e vou sumir na areia. Vamos, abra a caixa: palavras em pó. Vamos, lave minha alma com sabão em pó. Desate o nó, se enrosque em mim.
Tem horas que sou planta trepadeira. Me queira. De qualquer maneira.
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