FAZ DE CONTA
Míriam Salles

Tá. Eu até entendo que você não possa me amar. Mas por quê? Dá pra explicar? A gente se dá bem. A gente tem entrosamento. A gente até sabe conversar. Por que não pode me amar?

Fico aqui pensando que deve ser por causa daquele dia que eu quase te atropelei. Foi sem querer, você sabe disso. Eu não vi você chegar quando estava tirando o carro da garagem. Não foi por isso?

Ah! Então talvez aquele dia em que coloquei pimenta na sua comida. Achei que gostava, sempre falou que eu era sua pimentinha... Também não?

Então só pode ser por causa daquele dia quando fiquei com ciúme e joguei seu celular na piscina. Mas isso nem deveria ser motivo, já que depois eu te dei um mais moderno e com bateria que funciona. Ah, tá. Também não é esse o motivo.

Então desisto. Acredito. Você não me ama. Ponto. Deve ser porque não quer.

Putz! Porque não pensei nisto antes? Simples. Você tem medo. Tem medo de me amar e querer ficar comigo. Tem medo de querer que eu seja e esteja só para você. Sabe que não sei ser exclusiva e tem medo de não dar conta de me compartilhar. Talvez tenha medo de eu querer exclusividade. Acertei? Tanto faz, meu amor. Medo besta esse seu. De qualquer forma, eu entendi o recado e estou indo embora. Tá na hora.

Nossa despedida foi boa, melhor assim. Guardamos ambos na lembrança os momentos bons que passamos juntos. Nada de lembrar das discussões, hein? Lembre-se daqueles momentos em que éramos uma mesma alma, um só ser energético explodindo em mil cores.

Levo comigo aquelas lembranças todas e deixo para você o doce mais doce do meu beijo, o sabor mais ameno do meu imenso amor. Não diga nada. Não me olhe. Deixe-me sair de costas.

Faz de conta que nos desencontramos e que você simplesmente nunca mais pode me achar. Faz de conta que eu sou uma fantasia que você sonhou um dia, um sonho que foi tão real que você precisou se beliscar. Mas espere eu sair daqui antes de se beliscar, assim, terá certeza de que fui um sonho.

Está na hora de acordar.

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