BANDEIRA DOIS
Eduardo Prearo
Inexistência vespertina dura, não pranteio e não sei de mais nada nesta vadiagem burra. Chego atrasado em algum lugar, moro nalgum lugar que incomoda ou que tenho impressão de que incomoda. Inverdade esse incomodo. Incomodar a quem? As forças se esvaem, tudo some, tudo é fuga. O que vivi foi subjetivo menos do que real para algumas pessoas...O tempo torna certos pensamentos subjetivos...Essa inexistência tem um componente, tem vários, aliás, vários componentes, mas o que mais se mostra agora é aquele ligado à mentalidade. São Paulo é uma cidade bonita, cheia de lugares com iluminação digna dos melhores filmes de terror. Mas não há demônios visíveis nessa cidade.
E nunca haverá.
Do táxi avisto mendigos, ou melhor, seus cobertores. Eles ficam embaixo desse cobertores coloridos. Digo corra, corra, corra! E o táxi corre, mas ainda é lento, como é lento ainda o que faço, o meu agir, minha expressão. A miséria parece próxima, um retrocesso, homem retrógrado, retrocedendo duas ou três vezes por ano ao que era antes, ao miserável que era antes, ao relaxado, relapso, incrivelmente crente de que tudo é obra do destino. Corra senão vou me atrasar para o encontro. Corra, corra, corra!!!
É chegada a hora do encontro. Que horrível esta ociosidade, este descaso, esta indolência. Devia ser maravilhoso...mas não...não é maravilhoso...cheio de pecados, de vícios, de palavrões...a palavra pecaminosa saindo de sua boca...Não há ninguém no lugar marcado. Era para haver uma pessoa, uma pessoa que iria me dizer como ser mais útil, mas saudável, mais feliz. Mas não há ninguém no lugar marcado. Peço ao taxista que espere só mais um minutinho, só mais um minutinho. Estou pagando, não estou? Sim, nesta madrugada estou pagando tudo. Não é possível: dois minutos de atraso e a pessoa já se foi. Merda! Espero mais meia hora? Pontualidade é fundamental mesmo! E as pessoas nesta cidade são conservadoras. Estou tentando ser conservador, juro que estou tentando. No sentido de ter sempre as mesmas roupas há mais de cinco anos sou conservador. Não, não vejo muito esse componente conservador em mim. Não vejo. Peço ao taxista que espere só mais um minutinho. Era aqui, na porta do subviário que deveriamos nos encontrar. Ele ou ela iriam me falar como deixar de ser inútil!
Cortei o cabelo careca. Os conservadores não gostaram, mas não me perguntaram mais nada. Ah se fosse um milionário tudo bem! A individualidade se perde...talvez devamos ser todos iguaizinhos, conservadores, para termos essa individualidade. E o que é viril me dominando...de alguma forma.
Pare! Paguei e desci do táxi. Paguei? Rodando pela cidade, de madrugada...e nesse táxi.Esses desencontros fazem-nos perder tantas oportunidades...deixá-las para outra encarnação? Jesus.
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