CATAVENTO
Suzana Garcia

Voltei ao túmulo de Helena na tentativa de encontrar alguma coisa, sei lá, um sinal, um endereço já ressequido nas flores deixadas por amigos, parentes, alguém...

Um namorado, talvez.

Não conseguia imaginar Helena só, não concebia como uma mulher como Helena nunca tivesse recebido uma visita sequer, nunca encomendado uma pizza, comida chinesa, nem recebido uma carta.

Eu recebo, no mínimo, umas dez malas diretas por semana!
Mas, nada, com Helena nada acontecia...

Quanto menos informação conseguia, mais curioso eu ficava.

Quem é Helena?
Quem foi Helena?

Depois de sua morte, nunca mais consegui ler, à noite em minha poltrona de leitura, o livro colocado em meu colo entreaberto, já mostrava as marcas de minhas pernas.

Ato falho.

Só pensava em Helena.
Liguei a tv para ouvir as noticias do dia,
dólar, paz,crimes ecológicos, palavras-chave que não mais me prendiam.Mudo para uma emissora qualquer, numa mesa redonda de um canal universitário filosofavam sobre árvores genealógicas.

Eureka!
O nome!
Porque não pensei nisso!

Helena era só, mas não era só Helena!

Como era mesmo seu sobrenome? Por mais que me esforçasse para mim era Helena, a minha Helena.

Na manhã seguinte acordei o coveiro como se acordam os mortos.

Entrei sorrateiramente no cemitério por uma porta lateral da administração, que havia descoberto quando de minha última visita.
Lá estava eu, quadra quatro, e mesmo antes de chegar , avistei uma flor no tumulo de Helena. Colorida, girando.

Girando?

Apressei o passo e lá estava, não era flor, era um catavento!
Minha cabeça girava na mesma velocidade, por mais que quisesse entender ou buscar uma explicação plausível não encontrava.Já tinha visto de tudo, ou melhor, quase tudo - in memorian - flores, cartões, cartas, rosários, até bichinhos de pelúcia, mas catavento?

O cenário era tão absurdo que deixei de lado o que via, como uma desculpa para meu cérebro ,com a explicação de alguma “molecagem”.
Voltei à lápide :

Helena Siqueira Campos
mulher,poetisa e só
1957 - 1997

Dois caminhos se abriram diante de meus olhos, o primeiro e óbvio era de encontrar que encomendou a lápide, mas descobri rapidamente que foi resultado de uma coleta entre os moradores do condomínio.

O outro, descobrir seu registro e com ele, a cidade, a família, enfim...a vida de Helena.E assim, agradeci meus anos de fórum e por conhecer pessoas certas, não demorou muito para que eu recebesse , pelo correio, informações sobre Helena.

E lá estava...Helena Siqueira Campos, nascida aos 12 de junho de 1957, às 03:00hs , falecida aos 14 de junho de 1957. Causa mortis...insuficiência respiratória, Hospital Maternidade Santa Eulália.

Sentei-me para não cair!

Helena, minha doce Helena tinha um nome falso! Quem sabe uma vida dupla? Uma fugitiva? Quem era minha Helena?
Minha cabeça girava tanto que me lembrei do catavento...
Agora , a única lembrança concreta sobre ela.

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