FLORIANÓPOLIS
Larissa Schons

Nasci no dia 23 de março de 1726. Antes era apenas um pedacinho perdido no mar. Logo batizaram-me de Nossa Senhora do desterro. Gostei do nome, bem pomposo para a época, e da condição dado a mim, de Vila. Como forma de agradecimento fui embelezando-me. Na condição de lagoas, mangues, morros, dunas, pequenas ilhas e muitas praias. Quarenta e duas belas praias ao certo. Acho que gostaram do meu agrado porque desde 1747 venho sendo ocupada constantemente. Fiquei muito feliz com a chegada dos açorianos vindos de Portugal. Bem alegrinhos esses portugueses. Ensinaram-me muitas coisas como a cultivar a Festa do Divino, o Terno dos Reis e dos Lobisomens. Deste último de culto fantástico surgiu meu pseudônimo, Ilha da Magia. Era costume ouvir as histórias de bruxas, feiticeiras e lobisomem. Juro que até hoje elas existem e que são todas reais. 

Voltando as nomeações o que não pegou muito bem foi o meu nome de registro, Florianópolis. Uma homenagem ao marechal Floriano Peixoto. Muitos revoltaram-se. Também não é para menos. O homenageado deu a ordem de fuzilar, na Ilha de Anhatomirim, diversas pessoas que foram consideradas inimigas da República. Tempos conturbados esses! Mas enfim, é com grande alegria que comunico que desde 1823 assumi o posto de capital catarinense. 

Nessa época no meu centro já haviam plantado uma suntuosa Figueira. E junto a ela construíram uma praça, a Praça XV. Coração verde dos que aqui vivem. Por falar nos nativos, eles são carinhosamente chamados de "manézinhos da ilha". Figurinhas faceiras, hospitaleiras de muitas prosas e linguajar rápido e diversificado. O Manezês por assim dizer, eh, eh! Hoje eles não são muitos. Com a ocupação maçante os manézinhos se perderam no meu Sul e Norte. Do Sul, Ribeirão da Ilha e Pântano do Sul. Do Norte, Santo Antônio de Lisboa e Sambaqui. Reduto dos nativos que não deixam desfalecer suas origens. Mas há de se ressaltar as artesãs da Lagoa, as tradicionais rendeiras que na minha Costa Leste persistem cultivando o trabalho das rendas de bilro. Povo de tradição esse meu!

Falando em tradição não há nada mais bonito que a Ponte Hercílio Luz. Regalo que recebi dos manézinhos em 1926. De tanto que gostei deixei-a como meu símbolo maior. Se por ventura, lembrarem-se de mim, pensem na Ponte Hercílio Luz, por favor. Atualmente ela está desativada, porém à noite é vista decorada com luzes e ao entardecer continua servindo de inspiração aos poetas, enamorados, ninfas. Outros motivos de tradição e de muita rivalidade são os clássicos futebolísticos. Eu vou logo dizendo que torço pelos dois times. Avaí, o leão da Ilha e os alvinegros Figueirense. 

Sinto-me cada dia mais saudosa. Há muito que se lembrar. Há muito que se viver. Não me queixo dos novos habitantes, chamados de Geração Saúde. São lindos, carinhosos e cultos. Já me ganharam na intimidade chamando-me de Floripa. E são carinhosas essas criaturinhas. Comunicam-se como "queridos" e "neguinhos". E é um tal de "Tudo bem, neguinha? - Tudo certinho. Então, tá querido!". 

Coisa bonita de se ver! E eu fico aqui passando meu tempo acompanhando meus filhos pátrios, vivendo do passado e do futuro com muito amor. Amor incondicional, dado a mim, desde os primórdios. E no ritmo do Rancho de Amor à Ilha vou crescendo, vou seguindo colorida, sestrosa, monstruosa, e vou indo, indo, indo, ó-lhó-lhó!

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