BUSCA SEM FIM
Lauro Lima

Num primeiro momento acreditei que era ela. Tinha o dom de entender-me sem palavras, de antecipar-se ao desejo que eu nem sabia. De enxugar-me lágrimas ainda não vertidas. Demorei a perceber que manipulava, induzia, conduzia. Os caminhos não eram os meus, mas os dela. Não me via, moldava-me. Não me ouvia, convencia. Não me amava, amava-se em mim. Em boa hora desisti, tornando à procura.

Depois veio a outra. Suave e agressiva. Às vezes mansa, outras feroz. Ora orquídea, ora espinho. Encantou-me o contraste, o inesperado, a permanente surpresa. Podia ter sido essa, mas as fisgadas tornaram-se constantes demais, doídas demais, doentes demais. A doçura perdeu espaço e, por isso, sem bálsamo, as feridas não cicatrizavam. Refugiei-me na caverna escura da solidão, que embota e cura.

Apesar de arisco, mesmo temendo, esbarrei com aquela outra, numa noite chuvosa. O calor dos corpos me aqueceu. O abrigo quente me aconchegou. Fatal foi abrir as portas para receber e entregar. Também fatal o que veio a seguir, podia ter sido ela, é verdade. Pena que, para ela, não era eu. Nossas mãos se afastaram, com agradecimento e ternura.

Incendiei-me outras vezes, cheio de esperanças. Fogo que se extinguia tão rápido quanto surgia. Em pouco tempo eram, apenas, cinzas espalhadas ao vento. Sonhos que desvaneciam aos primeiros raios de sol. Lâmpadas de filamentos tênues que, partidos, não mais se emendavam. 

Aceitei crer que nunca a encontraria. Talvez ela estivesse vivendo noutro tempo. Quem sabe um século antes? Mas, então, porquê sua imagem me era tão nítida? Porquê seu jeito delicado me era tão caro? Porquê, até mesmo, sua voz soava em meus ouvidos nas noites de insônia e esperança?

Não. Não era possível. Meu coração tinha a certeza de que ela estava perto. Quem sabe na próxima esquina? No outro bairro? Na cidade vizinha? Num estado do norte?

Sei que meu tempo encurta. Acelero a procura. Esta é a razão do cartaz que carrego, das inúmeras cópias pregadas nos postes, nos pontos de ônibus, nos balcões de farmácias. "Procura-se".

Você viu esta mulher? Pense um pouco? Por favor, faça um esforço. Ela é gentil e alegre; disposta e disponível; mansa, terna, amorosa. Gosta de música suave e noites delicadas; de temperos fortes e conversas longas; do calor do sol e água de cachoeiras; de amor selvagem e cafunés sutis.

Sei que ela também me procura e espera. Que nenhum outro ouvido é capaz de compreender, plenamente, suas queixas; que nenhum outro colo pode dar-lhe o carinho que precisa; que nenhuma outra boca pode beijá-la com tamanha paixão. 

Ajude-me, por favor, a encontrá-la. Preciso mergulhar em seu olhar uma única e definitiva vez, nem que seja no segundo anterior ao meu último suspiro. Recompor os liames, as conexões, as sinapses. Não entendes o motivo? Ela é minha outra metade.

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