CAFÉ
AMARGO
Bárbara Helena
Fez o café sem pressa.
O tempo era seu companheiro inseparável. Seguia a seu lado na calçada e o via escorrer na umidade dos muros.
Entre os brilhos das poças do beco sujo em que morava podia vislumbrar seu caçoar perverso.
O canto do tempo ecoava nos seus ouvidos todos os dias, todos os minutos, todos os segundos e detalhes.
O café ficou amargo, forte demais numa vida cheia de tanto pouco.
Não gostava das coisas muitas, excessivas.
Queria a solidão amiga dos cinzas atemporais.
Já comprara vermelhos por rosa choque e tomara choques.
Sangrara em vão.
Agora via as flores na vitrine e sabia a canção.
Sabia o medo, a morte e muito mais o pão.
Sobre o sobejo era versado em letras principais.
Então, apenas tomou o café com mais açúcar.
Fechou bem a janela (não deixando uma fresta para o sol.).
Nunca tanto brilhar. Nunca tanto prazer.
Nunca tanto viver.
E o café, sobre a mesa, esfriou devagar.
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